sábado, 25 de setembro de 2010

XXVI DOMINGO DO TEMPO COMUM (ano C)



Leitura da Profecia de Amós
(Am 6,1a.4-7)
Eis o que diz o Senhor omnipotente: «Ai daqueles que vivem comodamente em Sião e dos que se sentem tranquilos no monte da Samaria. Deitados em leitos de marfim, estendidos nos seus divãs, comem os cordeiros do rebanho e os vitelos do estábulo. Improvisam ao som da lira e cantam como David as suas próprias melodias. Bebem o vinho em grandes taças e perfumam-se com finos unguentos, mas não os aflige a ruína de José. Por isso, agora partirão para o exílio à frente dos deportados e acabará esse bando de voluptuosos».

SALMO RESPONSORIAL – Salmo 145 (146)
Refrão: Ó minha alma, louva o Senhor.

O Senhor faz justiça aos oprimidos,
dá pão aos que têm fome
e a liberdade aos cativos.

O Senhor ilumina os olhos dos cegos,
o Senhor levanta os abatidos,
o Senhor ama os justos.

O Senhor protege os peregrinos,
ampara o órfão e a viúva
e entrava o caminho aos pecadores.

O Senhor reina eternamente.
O teu Deus, ó Sião,
é Rei por todas as gerações.


Leitura da Primeira Epístola do apóstolo São Paulo a Timóteo
(1 Tim 6,11-16)
Caríssimo: Tu, homem de Deus, pratica a justiça e a piedade, a fé e a caridade, a perseverança e a mansidão. Combate o bom combate da fé, conquista a vida eterna, para a qual foste chamado e sobre a qual fizeste tão bela profissão de fé perante numerosas testemunhas. Ordeno-te na presença de Deus, que dá a vida a todas as coisas, e de Cristo Jesus, que deu testemunho da verdade diante de Pôncio Pilatos: guarda este mandamento sem mancha e acima de toda a censura, até à aparição de Nosso Senhor Jesus Cristo, a qual manifestará a seu tempo o venturoso e único soberano, Rei dos reis e Senhor dos senhores, o único que possui a imortalidade e habita uma luz inacessível, que nenhum homem viu nem pode ver. A Ele a honra e o poder eterno. Amen.


Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
(Lc 16,19-31)
Naquele tempo, disse Jesus aos fariseus: «Havia um homem rico, que se vestia de púrpura e linho fino e se banqueteava esplendidamente todos os dias. Um pobre, chamado Lázaro, jazia junto do seu portão, coberto de chagas. Bem desejava saciar-se do que caía da mesa do rico, mas até os cães vinham lamber-lhe as chagas. Ora sucedeu que o pobre morreu e foi colocado pelos Anjos ao lado de Abraão. Morreu também o rico e foi sepultado. Na mansão dos mortos, estando em tormentos, levantou os olhos e viu Abraão com Lázaro a seu lado. Então ergueu a voz e disse: ‘Pai Abraão, tem compaixão de mim. Envia Lázaro, para que molhe em água a ponta do dedo e me refresque a língua, porque estou atormentado nestas chamas’. Abraão respondeu-lhe: ‘Filho, lembra-te que recebeste os teus bens em vida e Lázaro apenas os males. Por isso, agora ele encontra-se aqui consolado, enquanto tu és atormentado. Além disso, há entre nós e vós um grande abismo, de modo que se alguém quisesse passar daqui para junto de vós, ou daí para junto de nós, não poderia fazê-lo’. O rico insistiu: ‘Então peço-te, ó pai, que mandes Lázaro à minha casa paterna – pois tenho cinco irmãos – para que os previna, a fim de que não venham também para este lugar de tormento’. Disse-lhe Abraão: ‘Eles têm Moisés e os Profetas. Que os oiçam’. Mas ele insistiu: ‘Não, pai Abraão. Se algum dos mortos for ter com eles, arrepender-se-ão’. Abraão respondeu-lhe: ‘Se não dão ouvidos a Moisés nem aos Profetas, mesmo que alguém ressuscite dos mortos, não se convencerão’.


O ABISMO
Mais uma vez a liturgia da Palavra propõe-nos uma parábola difícil de interpretar... São-nos apresentados dois personagens: o pobre Lázaro e um homem rico que permanece anónimo. Os dois morrem e descobrimos que um está destinado aos “tormentos” e outro ao “banquete do Reino”. Nada sabemos das acções (boas ou más) praticadas neste mundo pelos dois personagens e as únicas pistas de interpretação que encontramos parecem relacionar-se com a riqueza e a pobreza que os distinguiam. Portanto, qual a conclusão que retiramos desta parábola? Que a riqueza é pecado? Que ser rico equivale a ser mau e portanto, a estar destinado aos “tormentos”? Atenção a não cair em leituras demasiado superficiais e “simplistas” do Evangelho, pois a mensagem profunda desta página é bastante mais complexa e interessante...

Sem sombra de dúvida, estamos diante de uma crítica à opulência e à ostentação, mas se o homem rico é condenado, não o é tanto pela riqueza que possui, quanto pela indiferença que caracterizou a sua vida.

A verdadeira questão é a administração dos bens terrenos e também os (pouco conhecidos e pouco meditados) pecados de omissão. Na lógica do Reino anunciado por Jesus, os bens terrenos não pertencem a ninguém em particular (nem sequer àqueles que trabalharam duramente e honestamente para os conquistar), mas são dons de Deus, postos à disposição de todos os seus filhos, para serem partilhados e para assegurarem uma vida digna a todos. Quem usa os bens para ter uma vida luxuosa, esquecendo-se das necessidades dos outros homens, está a defraudar o projecto de Deus e os seus irmãos que vivem na miséria.

A parábola diz-nos que entre o banquete do Reino e o “tormento” do homem rico existe um abismo, mas essa realidade não vem de Deus: é criada por nós mesmos e por uma vida de indiferença e apatia. Somos nós que “cavamos” esse fosso! ...quando olhamos em frente e tentamos não cruzar os olhos do pobre que nos suplica uma esmola; quando ouvimos a notícia de uma catástrofe e a nossa única acção é um encolher de ombros; quando sabemos que junto a nós alguém sofre e nada fazemos para o ajudar. O fosso é uma realidade que escolhemos e por isso apenas nós podemos enchê-lo e eliminá-lo. Como? Colmatando-o com sentimentos de compaixão e obras de misericórdia.


(Tenham uma boa semana!)


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sábado, 18 de setembro de 2010

XXV DOMINGO DO TEMPO COMUM (ano C)



Leitura da Profecia de Amos
(Am 8,4-7)
Escutai bem, vós que espezinhais o pobre e quereis eliminar os humildes da terra. Vós dizeis: «Quando passará a lua nova, para podermos vender o nosso grão? Quando chegará o fim de sábado, para podermos abrir os celeiros de trigo? Faremos a medida mais pequena, aumentaremos o preço, arranjaremos balanças falsas. Compraremos os necessitados por dinheiro e os indigentes por um par de sandálias. Venderemos até as cascas do nosso trigo». Mas o Senhor jurou pela glória de Jacob: «Nunca esquecerei nenhuma das suas obras».


SALMO RESPONSORIAL – Salmo 112 (113)
Refrão: Louvai o Senhor, que levanta os fracos.

Louvai, servos do Senhor,
louvai o nome do Senhor.
Bendito seja o nome do Senhor,
agora e para sempre.

O Senhor domina sobre todos os povos,
a sua glória está acima dos céus.
Quem se compara ao Senhor nosso Deus, que tem o seu trono nas alturas
e Se inclina lá do alto a olhar o céu e a terra.

Levanta do pó o indigente
e tira o pobre da miséria,
para o fazer sentar com os grandes,
com os grandes do seu povo.


Leitura da Primeira Epístola do apóstolo São Paulo a Timóteo
(1 Tim 2,1-8)
Caríssimo: Recomendo, antes de tudo, que se façam preces, orações, súplicas e acções de graças por todos os homens, pelos reis e por todas as autoridades, para que possamos levar uma vida tranquila e pacífica, com toda a piedade e dignidade. Isto é bom e agradável aos olhos de Deus, nosso Salvador; Ele quer que todos os homens se salvem e cheguem ao conhecimento da verdade. Há um só Deus e um só mediador entre Deus e os homens, o homem Jesus Cristo, que Se entregou à morte pela redenção de todos. Tal é o testemunho que foi dado a seu tempo e do qual fui constituído arauto e apóstolo – digo a verdade, não minto – mestre dos gentios na fé e na verdade. Quero, portanto, que os homens rezem em toda a parte, erguendo para o Céu as mãos santas, sem ira nem contenda.


Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
(Lc 16,1-13)
Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: «Um homem rico tinha um administrador que foi denunciado por andar a desperdiçar os seus bens. Mandou chamá-lo e disse-lhe: ‘Que é isto que ouço dizer de ti? Presta contas da tua administração, porque já não podes continuar a administrar’. O administrador disse consigo: ‘Que hei-de fazer, agora que o meu senhor me vai tirar a administração? Para cavar não tenho força, de mendigar tenho vergonha. Já sei o que hei-de fazer, para que, ao ser despedido da administração, alguém me receba em sua casa’. Mandou chamar um por um os devedores do seu senhor e disse ao primeiro: ‘Quanto deves ao meu senhor?’. Ele respondeu: ‘Cem talhas de azeite’. O administrador disse-lhe: ‘Toma a tua conta: senta-te depressa e escreve cinquenta’. A seguir disse a outro: ‘E tu quanto deves?’ Ele respondeu: ‘Cem medidas de trigo’. Disse-lhe o administrador: ‘Toma a tua conta e escreve oitenta’. E o senhor elogiou o administrador desonesto, por ter procedido com esperteza. De facto, os filhos deste mundo são mais espertos do que os filhos da luz, no trato com os seus semelhantes. Ora Eu digo-vos: Arranjai amigos com o vil dinheiro, para que, quando este vier a faltar, eles vos recebam nas moradas eternas. Quem é fiel nas coisas pequenas, também é fiel nas grandes; e quem é injusto nas coisas pequenas também é injusto nas grandes. Se não fostes fiéis no que se refere ao vil dinheiro, quem vos confiará o verdadeiro bem? E se não fostes fiéis no bem alheio, quem vos entregará o que é vosso? Nenhum servo pode servir a dois senhores, porque, ou não gosta de um deles e estima o outro, ou se dedicará a um e desprezará o outro. Não podeis servir a Deus e ao dinheiro».


FELIZES OS ALDRABÕES?
A parábola do administrador sagaz que encontramos no Evangelho deste domingo não é nada fácil de entender. Se não conhecêssemos as leis e costumes da Palestina Antiga, até poderíamos pensar que Jesus estava a elogiar as aldrabices do administrador... Mas, como veremos em seguida, não é esse o caso.

No tempo de Jesus, o administrador de uma propriedade actuava em nome do seu senhor, sem receber um salário fixo. Como não recebia remuneração, vivia graças a uma taxa que cobrava aos devedores do verdadeiro proprietário. Por exemplo: na parábola que escutámos, dos cem “baths” de azeite anotados no recibo (uns 3700 litros), possivelmente, só uns cinquenta haviam sido, na realidade, emprestados. Os outros cinquenta constituíam a exorbitante “comissão” que devia ser paga ao administrador. Provavelmente, o que este administrador fez foi renunciar ao lucro que lhe era devido, a fim de assegurar a gratidão dos devedores: renunciou a um lucro imediato, a fim de assegurar o seu futuro.

Este administrador, se é chamado “desonesto” (como podemos ler no final da parábola) não o é pelo gesto de abater as dívidas, mas sim, pelos actos anteriores, que até levaram o patrão a despedi-lo. O senhor louva-o, não pelas suas aldrabices, mas pela sua sagacidade em renunciar à sua taxa: o administrador sabe que o dinheiro tem um valor relativo e troca-o por outros valores mais significativos, tais como, a amizade e a gratidão.

«Arranjai amigos com o vil dinheiro, para que, quando este vier a faltar, eles vos recebam nas moradas eternas». Esta frase, que conclui a parábola do administrador sagaz, revela-nos a verdadeira lição que devemos aprender: os bens deste mundo são passageiros e devem ser utilizados, não como um fim em si mesmos, mas como instrumentos para ajudar os outros e socorrer os mais necessitados. E o bem que fizermos testemunhará/confirmará a nossa escolha por Cristo, pois não podemos “comprar” a salvação, mas tal como diz São Tiago: «a fé sem obras está completamente morta. (...) Mostra-me a tua fé sem obras, que eu, pelas obras, te mostrarei a minha fé» (Tg 2,17-18).


(Tenham uma boa semana!)



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sábado, 11 de setembro de 2010

XXIV DOMINGO DO TEMPO COMUM (ano C)



Leitura do Livro do Êxodo
(Ex 32, 7-11.13-14)
Naqueles dias, o Senhor falou a Moisés, dizendo: «Desce depressa, porque o teu povo, que tiraste da terra do Egipto, corrompeu-se. Não tardaram em desviar-se do caminho que lhes tracei. Fizeram um bezerro de metal fundido, prostraram-se diante dele, ofereceram-lhe sacrifícios e disseram: ‘Este é o teu Deus, Israel, que te fez sair da terra do Egipto’». O Senhor disse ainda a Moisés: «Tenho observado este povo: é um povo de dura cerviz. Agora deixa que a minha indignação se inflame contra eles e os destrua. De ti farei uma grande nação». Então Moisés procurou aplacar o Senhor seu Deus, dizendo: «Por que razão, Senhor, se há-de inflamar a vossa indignação contra o vosso povo, que libertastes da terra do Egipto com tão grande força e mão tão poderosa? Lembrai-Vos dos vossos servos Abraão, Isaac e Israel, a quem jurastes pelo vosso nome, dizendo: ‘Farei a vossa descendência tão numerosa como as estrelas do céu e dar-lhe-ei para sempre em herança toda a terra que vos prometi’». Então o Senhor desistiu do mal com que tinha ameaçado o seu povo.


SALMO RESPONSORIAL Salmo 50 (51), 3-4.12-13.17.19
Refrão: Vou partir e vou ter com meu pai.

Compadecei-Vos de mim, ó Deus,
pela vossa bondade,
pela vossa grande misericórdia,
apagai os meus pecados.
Lavai-me de toda a iniquidade
e purificai-me de todas as faltas.

Criai em mim, ó Deus, um coração puro
e fazei nascer dentro de mim um espírito firme.
Não queirais repelir-me da vossa presença
e não retireis de mim o vosso espírito de santidade.

Abri, Senhor, os meus lábios
e a minha boca anunciará o vosso louvor.
Sacrifício agradável a Deus
é um espírito arrependido:
não desprezeis, Senhor,
um espírito humilhado e contrito.


Leitura da Primeira Epístola do apóstolo São Paulo a Timóteo
(1 Tim 1, 12-17)
Caríssimo: Dou graças Àquele que me deu força, Jesus Cristo, Nosso Senhor, que me julgou digno de confiança e me chamou ao seu serviço, a mim que tinha sido blasfemo, perseguidor e violento. Mas alcancei misericórdia, porque agi por ignorância, quando ainda era descrente. A graça de Nosso Senhor superabundou em mim, com a fé e a caridade que temos em Cristo Jesus. É digna de fé esta palavra e merecedora de toda a aceitação: Cristo Jesus veio ao mundo para salvar os pecadores e eu sou o primeiro deles. Mas alcancei misericórdia, para que, em mim primeiramente, Jesus Cristo manifestasse toda a sua magnanimidade, como exemplo para os que hão-de acreditar n’Ele, para a vida eterna. Ao Rei dos séculos, Deus imortal, invisível e único, honra e glória pelos séculos dos séculos. Amen.


Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
(Lc 15,1-32)
Naquele tempo, os publicanos e os pecadores aproximaram-se todos de Jesus, para O ouvirem. Mas os fariseus e os escribas murmuravam entre si, dizendo: «Este homem acolhe os pecadores e come com eles». Jesus disse-lhes então a seguinte parábola: «Quem de vós, que possua cem ovelhas e tenha perdido uma delas, não deixa as outras noventa e nove no deserto, para ir à procura da que anda perdida, até a encontrar? Quando a encontra, põe-na alegremente aos ombros e, ao chegar a casa, chama os amigos e vizinhos e diz-lhes: ‘Alegrai-vos comigo, porque encontrei a minha ovelha perdida’. Eu vos digo: Assim haverá mais alegria no Céu por um só pecador que se arrependa, do que por noventa e nove justos, que não precisam de arrependimento. Ou então, qual é a mulher que, possuindo dez dracmas e tendo perdido uma, não acende uma lâmpada, varre a casa e procura cuidadosamente a moeda até a encontrar? Quando a encontra, chama as amigas e vizinhas e diz-lhes: ‘Alegrai-vos comigo, porque encontrei a dracma perdida’. Eu vos digo: Assim haverá alegria entre os Anjos de Deus por um pecador que se arrependa». Jesus disse-lhes ainda: «Um homem tinha dois filhos. O mais novo disse ao pai: ‘Pai, dá-me parte da herança que me toca’. O pai repartiu os bens pelos filhos. Alguns dias depois, o filho mais novo, juntando todos os seus haveres, partiu para um país distante e por lá esbanjou quanto possuía, numa vida dissoluta. Tendo gasto tudo, houve uma grande fome naquela região e ele começou a passar privações. Entrou então ao serviço de um dos habitantes daquela terra que o mandou para os seus campos guardar porcos. Bem desejava ele matar a fome com as alfarrobas que os porcos comiam, mas ninguém lhas dava. Então, caindo em si, disse: ‘Quantos trabalhadores de meu pai têm pão em abundância, e eu aqui a morrer de fome! Vou-me embora, vou ter com meu pai e dizer-lhe: Pai, pequei contra o Céu e contra ti. Já não mereço ser chamado teu filho, mas trata-me como um dos teus trabalhadores’. Pôs-se a caminho e foi ter com o pai. Ainda ele estava longe, quando o pai o viu: Enchendo-se de compaixão, correu a lançar-se-lhe ao pescoço, cobrindo-o de beijos. Disse-lhe o filho: ‘Pai, pequei contra o Céu e contra ti. Já não mereço ser chamado teu filho’. Mas o pai disse aos servos: ‘Trazei depressa a melhor túnica e vesti-lha. Ponde-lhe um anel no dedo e sandálias nos pés. Trazei o vitelo gordo e matai-o. Comamos e festejemos, porque este meu filho estava morto e voltou à vida, estava perdido e foi reencontrado’. E começou a festa. Ora o filho mais velho estava no campo. Quando regressou, ao aproximar-se da casa, ouviu a música e as danças. Chamou um dos servos e perguntou-lhe o que era aquilo. O servo respondeu-lhe: ‘O teu irmão voltou e teu pai mandou matar o vitelo gordo, porque ele chegou são e salvo’. Ele ficou ressentido e não queria entrar. Então o pai veio cá fora instar com ele. Mas ele respondeu ao pai: ‘Há tantos anos que eu te sirvo, sem nunca transgredir uma ordem tua, e nunca me deste um cabrito para fazer uma festa com os meus amigos. E agora, quando chegou esse teu filho, que consumiu os teus bens com mulheres de má vida, mataste-lhe o vitelo gordo’. Disse-lhe o pai: ‘Filho, tu estás sempre comigo e tudo o que é meu é teu. Mas tínhamos de fazer uma festa e alegrar-nos, porque este teu irmão estava morto e voltou à vida, estava perdido e foi reencontrado’».


QUEM? NINGUÉM! SOMENTE...
Já aqui falámos uma vez da parábola do “Pai misericordioso” (se não se lembram, cliquem AQUI) e por isso, hoje convido-vos a concentrar a vossa atenção na primeira das três parábolas da misericórdia: a parábola da ovelha perdida.

Normalmente as parábolas propõem-nos situações típicas da vida quotidiana, que Jesus convida a comparar com uma realidade maior. Graças a essa comparação (esse paralelo... daí o nome “parábola”), Ele ajuda-nos a descobrir uma verdade nova. Portanto, habitualmente, começa-se com um exemplo simples e familiar; algo bem concreto que todos podem perceber. Porém, o Evangelho deste domingo não segue os passos que acabámos de descrever, pois a parábola da ovelha perdida parte de uma situação profundamente estranha e atípica.

«Quem de vós – pergunta Jesus – não deixa noventa e nove ovelhas sozinhas no deserto, para ir à procura de uma que anda perdida?» Resposta: ninguém. Nenhum pastor, de mente sã, deixaria um rebanho inteiro abandonado, para procurar uma pobre ovelha extraviada. E ninguém, ajuizado, incomodaria amigos e vizinhos, com a notícia (pouco interessante...) de uma ovelha encontrada. Quem poderia agir desta forma ilógica e incoerente? Quem poderia fazer todo este espalhafato à volta de um facto banal como é o reencontro com uma ovelha que se extraviou… Somente um louco ou um apaixonado. Mas Deus ama-nos loucamente...

Nestes exageros e nestas reacções desproporcionadas revela-se a mensagem essencial da parábola: a atitude de Jesus para com os pecadores (que tanto aborreceu os fariseus) segue a lógica de Deus em relação aos filhos afastados. Deus não os rejeita, não os marginaliza, mas ama-os sempre. Loucamente!

Não é fácil entrar nesta lógica da misericórdia e da não-exclusão: infelizmente, é bem mais simples excomungar... Mas essa não é a lógica do Pai! E todos nós, todos os “filhos de Deus”, devemos converter o nosso coração, a nossa mentalidade e as nossas regras à lógica da misericórdia. Não é que Deus pactue com o pecado: Deus abomina o pecado, mas, tal como escutámos nestas três parábolas, Ele não deixa nunca (nunca!) de amar/procurar/acolher o pecador.


(Tenham uma boa semana)



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sábado, 4 de setembro de 2010

XXIII DOMINGO DO TEMPO COMUM (ano C)



Leitura do Livro da Sabedoria
(I Sab 9, 13-19) (gr. 13-18b)
Qual o homem que pode conhecer os desígnios de Deus? Quem pode sondar as intenções do Senhor? Os pensamentos dos mortais são mesquinhos e inseguras as nossas reflexões, porque o corpo corruptível deprime a alma e a morada terrestre oprime o espírito que pensa. Mal podemos compreender o que está sobre a terra e com dificuldade encontramos o que temos ao alcance da mão. Quem poderá então descobrir o que há nos céus? Quem poderá conhecer, Senhor, os vossos desígnios, se Vós não lhe dais a sabedoria e não lhe enviais o vosso espírito santo? Deste modo foi corrigido o procedimento dos que estão na terra, os homens aprenderam as coisas que Vos agradam e pela sabedoria foram salvos.


SALMO RESPONSORIAL Salmo 89 (90), 3-6.12-14.17
Refrão: Senhor, tendes sido o nosso refúgio através das gerações.

Vós reduzis o homem ao pó da terra
e dizeis: «Voltai, filhos de Adão».
Mil anos a vossos olhos
são como o dia de ontem que passou
e como uma vigília da noite.

Vós os arrebatais como um sonho,
como a erva que de manhã reverdece;
de manhã floresce e viceja,
à tarde ela murcha e seca.

Ensinai-nos a contar os nossos dias,
para chegarmos à sabedoria do coração.
Voltai, Senhor! Até quando...
Tende piedade dos vossos servos.

Saciai-nos desde a manhã com a vossa bondade,
para nos alegrarmos e exultarmos todos os dias.
Desça sobre nós a graça do Senhor nosso Deus.
Confirmai, Senhor, a obra das nossas mãos.


Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo a Filémon
(Flm 9b-10.12-17)
Caríssimo: Eu, Paulo, prisioneiro por amor de Cristo Jesus, rogo-te por este meu filho, Onésimo, que eu gerei na prisão. Mando-o de volta para ti, como se fosse o meu próprio coração. Quisera conservá-lo junto de mim, para que me servisse, em teu lugar, enquanto estou preso por causa do Evangelho. Mas, sem o teu consentimento, nada quis fazer, para que a tua boa acção não parecesse forçada, mas feita de livre vontade. Talvez ele se tenha afastado de ti durante algum tempo, a fim de o recuperares para sempre, não já como escravo, mas muito melhor do que escravo: como irmão muito querido. É isto que ele é para mim e muito mais para ti, não só pela natureza, mas também aos olhos do Senhor. Se me consideras teu amigo, recebe-o como a mim próprio.


Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
(Lc 14,25-33)
Naquele tempo, seguia Jesus uma grande multidão. Jesus voltou-Se e disse-lhes: «Se alguém vem ter comigo, sem Me preferir ao pai, à mãe, à esposa, aos filhos, aos irmãos, às irmãs e até à própria vida, não pode ser meu discípulo. Quem não toma a sua cruz para Me seguir, não pode ser meu discípulo. Quem de entre vós, que, desejando construir uma torre, Não se senta primeiro a calcular a despesa, para ver se tem com que terminá-la? Não suceda que, depois de assentar os alicerces, se mostre incapaz de a concluir e todos os que olharem comecem a fazer troça, dizendo: ‘Esse homem começou a edificar, mas não foi capaz de concluir’. E qual é o rei que parte para a guerra contra outro rei e não se senta primeiro a considerar se é capaz de se opor, com dez mil soldados, àquele que vem contra com ele com vinte mil? Aliás, enquanto o outro ainda está longe, manda-lhe uma delegação a pedir as condições de paz. Assim, quem de entre vós não renunciar a todos os seus bens, não pode ser meu discípulo».


RENUNCIAR
Esta é a segunda vez, desde que este blog nasceu, que o comentário é escrito, literalmente, no céu! Mais precisamente, nos céus da Europa, durante o voo que me leva para a minha nova missão, em Paris. Neste últimos dias, já tinha lido algumas vezes o Evangelho dominical e até tinha organizado algumas ideias para a homilia. No entanto, ao reler esta página de Lucas, aqui no avião, resolvi colocar o rascunho de lado e escrever algo um pouco diferente.

Como já repararam, esta semana o Evangelho fala-nos da necessidade de “aprender a renunciar”. Obviamente, uma coisa é falar de “renúncia” estando em Peniche, sentado no conforto do meu velho quartinho; bem diferente é escrever este comentário pouco depois de ter feito a mala e escolhido o que levar e o que deixar... de me ter despedido mais uma vez da minha família no aeroporto... de ter deixado novamente para trás a minha cidade e o meu país. A perspectiva muda bastante.

O caminho do “Reino” é exigente! Porém, as frases fortes e provocadoras que encontramos na boca de Jesus não são um convite a rejeitar os laços que nos unem àqueles que amamos… Contudo, esses laços afectivos, por mais sagrados que sejam, não devem nunca afastar-nos dos valores do “Reino” ou da nossa vocação cristã. Optar pelo “Reino” não é escolher um caminho de facilidade, mas sim, aceitar percorrer uma estrada de renúncia e de dom da vida. Quem deseja seguir Jesus e abraçar a Sua proposta de vida, tem de pensar seriamente se a quer acolher, se tem forças para a acolher… E enganam-se aqueles que pensam que este nível de exigência seja apenas para um pequeno grupo de pessoas: no Evangelho deste domingo, Jesus fala a «uma grande multidão». Colocar a própria vida ao serviço do “Reino” e assumir com radicalidade os valores do Evangelho não é a missão de poucos escolhidos: é a missão de todos nós.

Quase poderíamos lançar a seguinte “pergunta da semana”: onde é que eu me situo face ao que escutei? O projecto de Jesus é, para mim, uma opção radical, que abracei com convicção e a tempo inteiro ou é apenas um projecto em que vou estando, sem grande esforço ou compromisso, por inércia, por comodismo, por tradição?

Coragem! Não nos desanimemos com os limites da nossa resposta. Para se ser cristãos é necessária uma vida inteira de treino. A nossa fé é Caminho e é preciso caminhar! E a “renúncia” é um exercício onde todos podemos (e devemos) melhorar. Prova disso é a multa bem pesada que paguei há pouco no aeroporto pelos 4,8kg de peso a mais que levava dentro da minha mala.


(Tenham uma boa semana!)


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