sábado, 27 de dezembro de 2008

FESTA DA SAGRADA FAMÍLIA (ano B)




Leitura do Livro de Ben-Sirá
(Sir 3,3-7.14-17a versão grega: 3,2-6.12-14)
Deus quis honrar os pais nos filhos e firmou sobre eles a autoridade da mãe. Quem honra seu pai obtém o perdão dos pecados e acumula um tesouro quem honra sua mãe. Quem honra o pai encontrará alegria nos seus filhos e será atendido na sua oração. Quem honra seu pai terá longa vida, e quem lhe obedece será o conforto de sua mãe. Filho, ampara a velhice do teu pai e não o desgostes durante a sua vida. Se a sua mente enfraquece, sê indulgente para com ele e não o desprezes, tu que estás no vigor da vida, porque a tua caridade para com teu pai nunca será esquecida e converter-se-á em desconto dos teus pecados.


SALMO RESPONSORIAL – Salmo 127 (128)
Refrão: Felizes os que esperam no Senhor, e seguem os seus caminhos.

Feliz de ti, que temes o Senhor
e andas nos seus caminhos.
Comerás do trabalho das tuas mãos,
serás feliz e tudo te correrá bem.

Tua esposa será como videira fecunda
no íntimo do teu lar;
teus filhos serão como ramos de oliveira
ao redor da tua mesa.

Assim será abençoado o homem que teme o Senhor.
De Sião te abençoe o Senhor:
vejas a prosperidade de Jerusalém
todos os dias da tua vida.


Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos Colossenses
(Col 3, 12-21)
Irmãos: Como eleitos de Deus, santos e predilectos, revesti-vos de sentimentos de misericórdia, de bondade, humildade, mansidão e paciência. Suportai-vos uns aos outros e perdoai-vos mutuamente, se algum tiver razão de queixa contra outro. Tal como o Senhor vos perdoou, assim deveis fazer vós também. Acima de tudo, revesti-vos da caridade, que é o vínculo da perfeição. Reine em vossos corações a paz de Cristo, à qual fostes chamados para formar um só corpo. E vivei em acção de graças. Habite em vós com abundância a palavra de Cristo, para vos instruirdes e aconselhardes uns aos outros com toda a sabedoria; e com salmos, hinos e cânticos inspirados, cantai de todo o coração a Deus a vossa gratidão. E tudo o que fizerdes, por palavras ou por obras, seja tudo em nome do Senhor Jesus, dando graças, por Ele, a Deus Pai. Esposas, sede submissas aos vossos maridos, como convém no Senhor. Maridos, amai as vossas esposas e não as trateis com aspereza. Filhos, obedecei em tudo a vossos pais, porque isto agrada ao Senhor. Pais, não exaspereis os vossos filhos, para que não caiam em desânimo.


Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
(Lc 2,22-40)
Ao chegarem os dias da purificação, segundo a Lei de Moisés, Maria e José levaram Jesus a Jerusalém, para O apresentarem ao Senhor, como está escrito na Lei do Senhor: «Todo o filho primogénito varão será consagrado ao Senhor», e para oferecerem em sacrifício um par de rolas ou duas pombinhas, como se diz na Lei do Senhor. Vivia em Jerusalém um homem chamado Simeão, homem justo e piedoso, que esperava a consolação de Israel; e o Espírito Santo estava nele. O Espírito Santo revelara-lhe que não morreria antes de ver o Messias do Senhor; e veio ao templo, movido pelo Espírito. Quando os pais de Jesus trouxeram o Menino para cumprirem as prescrições da Lei no que lhes dizia respeito, Simeão recebeu-O em seus braços e bendisse a Deus, exclamando:

«Agora, Senhor, segundo a vossa palavra,
deixareis ir em paz o vosso servo,
porque os meus olhos viram a vossa salvação,
que pusestes ao alcance de todos os povos:
luz para se revelar às nações
e glória de Israel, vosso povo».

O pai e a mãe do Menino Jesus estavam admirados com o que d’Ele se dizia. Simeão abençoou-os e disse a Maria, sua Mãe: «Este Menino foi estabelecido para que muitos caiam ou se levantem em Israel e para ser sinal de contradição; - e uma espada trespassará a tua alma - assim se revelarão os pensamentos de todos os corações». Havia também uma profetiza, Ana, filha de Fanuel, da tribo de Aser. Era de idade muito avançada e tinha vivido casada sete anos após o tempo de donzela e viúva até aos oitenta e quatro. Não se afastava do templo, servindo a Deus noite e dia, com jejuns e orações. Estando presente na mesma ocasião, começou também a louvar a Deus e a falar acerca do Menino a todos os que esperavam a libertação de Jerusalém. Cumpridas todas as prescrições da Lei do Senhor, voltaram para a Galileia, para a sua cidade de Nazaré. Entretanto, o Menino crescia e tornava-Se robusto, enchendo-Se de sabedoria. E a graça de Deus estava com Ele.


Só Deus sabe o que terá pensado Maria quando Simeão pegou Jesus nos seus braços. Será que se assustou? Eu imagino-a, com uma olhada discreta, a encorajar José para que retire a criança das mãos daquele excêntrico velhinho... Imagino-a também, muitos anos mais tarde, quando a Igreja já move os primeiros passos, a contar este episódio a um jovem médico chamado Lucas. Passaram muitos anos desde aquele encontro no templo, mas a memória de Maria vê sempre mais claramente os eventos do passado. Recorda bem a alegria de Ana e o ar maravilhado de José que não sabe o que pensar de todo aquele alvoroço. Mas a recordação mais forte, é a oração de Simeão. Repete-a a Lucas, palavra por palavra, e ele escreve-a com atenção, talvez sem sequer suspeitar que lhe foi confiado um tesouro.

Dois milénios passaram. As palavras de Simeão foram traduzidas em todas as línguas do mundo. São escutadas nas nossas igrejas, proclamadas pelos sacerdotes que anunciam o Evangelho e são repetidas antes de adormecer por cristãos em tudo o mundo. São poucas palavras, mas a mensagem que contêm é clara: a vida e a morte não nos podem assustar. O encontro com Deus vence todos os medos, todos os receios. Não temam! Jesus Cristo é “Emanuel”, o “Deus-connosco”.

Senhor ajuda-nos a viver vidas corajosas, a sonhar sonhos audazes e a abraçar projectos ambiciosos. Não deixes que as dificuldades ou os sacrifícios nos assustem, mas sustem-nos com o Teu amor. Contigo, nada é impossível e nenhuma meta é demasiado distante. *

(tenham uma boa semana)

* escrito originalmente em italiano para um projecto da pastoral juvenil scalabriniana



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sábado, 20 de dezembro de 2008

4º DOMINGO DO ADVENTO (ano B)



Leitura do Segundo Livro de Samuel
(2 Sam 7,1-5.8b-12.14a.16)
Quando David já morava em sua casa e o Senhor lhe deu tréguas de todos os inimigos que o rodeavam, o rei disse ao profeta Natã: «Como vês, eu moro numa casa de cedro, e a arca de Deus está debaixo de uma tenda». Natã respondeu ao rei: «Faz o que te pede o teu coração, porque o Senhor está contigo». Nessa mesma noite, o Senhor falou a Natã, dizendo: «Vai dizer ao meu servo David: Assim fala o Senhor: Pensas edificar um palácio para Eu habitar? Tirei-te das pastagens onde guardavas os rebanhos, para seres o chefe do meu povo de Israel. Estive contigo em toda a parte por onde andaste e exterminei diante de ti todos os teus inimigos. Dar-te-ei um nome tão ilustre como o nome dos grandes da terra. Prepararei um lugar para o meu povo de Israel: e nele o instalarei para que habite nesse lugar, sem que jamais tenha receio e sem que os perversos tornem a oprimi-lo como outrora, quando Eu constituía juízes no meu povo de Israel. Farei que vivas seguro de todos os teus inimigos. O Senhor anuncia que te vai fazer uma casa. Quando chegares ao termo dos teus dias e fores repousar com teus pais estabelecerei em teu lugar um descendente que há-de nascer de ti e consolidarei a tua realeza. Ele construirá um palácio ao meu nome e Eu consolidarei para sempre o teu trono real. Serei para ele um pai e ele será para Mim um filho. A tua casa e o teu reino permanecerão diante de Mim eternamente e o teu trono será firme para sempre.


SALMO RESPONSORIAL – Salmo 88 (89)
Refrão: Cantarei eternamente as misericórdias do Senhor.

Cantarei eternamente as misericórdias do Senhor
e para sempre proclamarei a sua fidelidade.
Vós dissestes: «A bondade está estabelecida para sempre»,
no céu permanece firme a vossa fidelidade.

«Concluí uma aliança com o meu eleito,
fiz um juramento a David meu servo:
‘Conservarei a tua descendência para sempre,
estabelecerei o teu trono por todas as gerações’».

«Ele Me invocará: ‘Vós sois meu Pai,
meu Deus, meu Salvador’.
Assegurar-lhe-ei para sempre o meu favor,
a minha aliança com ele será irrevogável».


Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos Romanos
(Rom 16,25-27)
Irmãos: Àquele que tem o poder de vos confirmar, segundo o meu Evangelho e a pregação de Jesus Cristo – a revelação do mistério encoberto desde os tempos eternos mas agora manifestado e dado a conhecer a todos os povos pelas escrituras dos Profetas segundo a ordem do Deus eterno, dado a conhecer a todos os gentios para que eles obedeçam à fé – a Deus, o único sábio, por Jesus Cristo, seja dada glória pelos séculos dos séculos. Amen.


Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
(Lc 1,26-38)
Naquele tempo, o Anjo Gabriel foi enviado por Deus a uma cidade da Galileia chamada Nazaré, a uma Virgem desposada com um homem chamado José. O nome da Virgem era Maria. Tendo entrado onde ela estava, disse o Anjo: «Ave, cheia de graça, o Senhor está contigo; bendita és tu entre as mulheres». Ela ficou perturbada com estas palavras e pensava que saudação seria aquela. Disse-lhe o Anjo: «Não temas, Maria, porque encontraste graça diante de Deus. Conceberás e darás à luz um Filho, a quem porás o nome de Jesus. Ele será grande e chamar-Se-á Filho do Altíssimo. O Senhor Deus Lhe dará o trono de seu pai David; e o seu reinado não terá fim». Maria disse ao Anjo: «Como será isto, se eu não conheço homem?» O Anjo respondeu-lhe: «O Espírito Santo virá sobre ti e a força do Altíssimo te cobrirá com a sua sombra. Por isso o Santo que vai nascer será chamado Filho de Deus. E a tua parenta Isabel concebeu também um filho na sua velhice porque a Deus nada é impossível». Maria disse então: «Eis a escrava do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra».


SIM
No Domingo em que a liturgia da palavra nos propõe o relato da vocação de Maria decidi fazer uma coisa diferente. Enquanto dava uma limpeza ao meu computador encontrei um velho ficheiro onde há uns anos atrás tinha tentado (d)escrever a história da minha vocação. Se me recordo bem, fazia parte de uma longa carta que enviei para o seminário da Amora na altura em que me preparava para professar os votos perpétuos. Ao longo dos anos várias pessoas me pediram que contasse a história da minha entrada no seminário. Neste texto não vão encontrar respostas a todas as questões ou esclarecidas todas as dúvidas. Mas é um começo. É o começo do meu “sim”.

(...) Nunca tinha sequer considerado a hipótese de um dia entrar num seminário. Muito pelo contrário. Era um daqueles que diziam: «Padre? Eu? Nunca! Quero mas é casar-me e ter um dúzia de filhos». Porém, algum tempo antes de fazer 18 anos, comecei a sentir que algo que me inquietava cá dentro. Não sabia o que era, mas que havia qualquer coisa, lá isso havia.

Quando pela primeira vez me passou pela cabeça que aquela estranha sensação podia ser o tal famoso “chamamento” de que me tinham falado algumas vezes na catequese, a minha reacção foi clara e imediata: «Devo estar é doido!». E liquidei o assunto num abrir e fechar de olhos: «Nem pensar! A mim não me apanham num seminário. Nem quero pensar mais nesta história. Ponto final. Assunto arrumado». Mas como podem imaginar, não terminou ali. Aquela estranha sensação não me abandonou e com o passar das semanas, apesar dos meus esforços por ignorá-la, foi-se tornando cada vez mais forte e, a uma certa altura, eu já não podia fingir que não a sentia. Resolvi que estava na hora de “enfrentar” Deus. E rezei-lhe, mais ou menos, assim:

«Parece-me que Tu me estás a querer dizer alguma coisa. E acho que até já percebi o me estás a pedir. Mas eu não posso dar um passo desses sem ter a certeza absoluta de que realmente esta é a estrada que Tu me estás a indicar. No mundo existem tantas pessoas que têm estranhas visões, falam com anjos, vêem a Nossa Senhora, etc. Eu não te vou pedir nada de muito complicado e nem preciso que te canses com efeitos especiais. A mim basta-me uma voz que eu possa ouvir. Não peço mais nada a não ser uma pequena voz, aqui junto da minha orelha, para que eu possa ouvir claramente qual é a Tua vontade sobre mim. Para que eu tenha a certeza absoluta de que esta é a estrada que eu devo seguir».

E assim se passaram várias semanas em que eu esperei que Deus me falasse. Procurei a sua voz em tantos lados e, quando já estava quase a desistir, compreendi uma coisa: compreendi o quanto estava a ser palerma...
Parei de procurar vozes fora de mim e fiz silêncio para conseguir escutar o que desde o começo, cá dentro, tentava fazer-se ouvir. Porque Deus Pai não fala aos seus filhos somente em grandes e raras ocasiões. Ele fala connosco todos os dias. Somos nós que fazemos tanto barulho que depois não O conseguimos escutar. Bastou-me fazer um pouco de silêncio para conseguir perceber o que Ele me dizia há já tanto tempo: «Confia em mim. Deixa tudo e segue-Me».

Procurei um padre que me pudesse aconselhar e tinha planeado dizer-lhe... que estava um pouco confuso... que não sabia bem o que fazer com a minha vida... Mas quando abri a boca, aquilo que saiu foi mais ou menos isto: «Decidi que quero entrar no seminário. Com quem é que tenho de falar?»

Era a primeira vez que discutia este assunto com alguém.
Era a primeira vez que me ouvia a mim mesmo, a falar em voz alta sobre este tema. E o que é que eu tinha dito? Tinha dito “sim”. Naquele momento tive a certeza de que Deus me chamava. É uma coisa estranha, mas enquanto não tiveres respondido, não tens realmente a certeza de ter sido chamado. Foi uma sensação incrível: era como se de repente, tudo fosse claro. Sentia como se me tivesse achado a mim mesmo: era a pessoa mais feliz deste mundo.(...)



(tenham uma boa semana e um Santo Natal!)


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sábado, 13 de dezembro de 2008

3º DOMINGO DO ADVENTO (ano B)


Leitura do Livro de Isaías
(Is 61,1-2a.10-11)
O espírito do Senhor está sobre mim, porque o Senhor me ungiu e me enviou a anunciar a boa nova aos pobres, a curar os corações atribulados, a proclamar a redenção aos cativos e a liberdade aos prisioneiros, a promulgar o ano da graça do Senhor. Exulto de alegria no Senhor, a minha alma rejubila no meu Deus, que me revestiu com as vestes da salvação e em envolveu num manto de justiça, como noivo que cinge a fronte com o diadema e a noiva que se adorna com as suas jóias. Como a terra faz brotar os germes e o jardim germinar as sementes, assim o Senhor Deus fará brotar a justiça e o louvor diante de todas as nações.


SALMO RESPONSORIAL – Lc 1, 46-48.49-50.53-54
Refrão: Exulto de alegria no Senhor.

A minha alma glorifica o Senhor
e o meu espírito se alegra em Deus, meu Salvador,
porque pôs os olhos na humildade da sua serva:
de hoje em diante me chamarão bem-aventurada todas as gerações.

O Todo-poderoso fez em mim maravilhas:
Santo é o seu nome.
A sua misericórdia se estende de geração em geração
sobre aqueles que O temem.

Aos famintos encheu de bens
e aos ricos despediu-os de mãos vazias.
Acolheu a Israel, seu servo,
lembrado da sua misericórdia.


Leitura da Primeira Epístola do apóstolo São Paulo aos Tessalonicenses
(1 Tes 5,16-24)
Irmãos: Vivei sempre alegres, orai sem cessar, dai graças em todas as circunstâncias, pois esta é a vontade de Deus a vosso respeito em Cristo Jesus. Não apagueis o Espírito, não desprezeis os dons proféticos; mas avaliai tudo, conservando o que for bom. Afastai-vos de toda a espécie de mal. O Deus da paz vos santifique totalmente, para que todo o vosso ser – espírito, alma e corpo – se conserve irrepreensível para a vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo. É fiel Aquele que vos chama e cumprirá as suas promessas.


Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São João
(Jo 1,6-8.19-28)
Apareceu um homem enviado por Deus, chamado João. Veio como testemunha, para dar testemunho da luz, a fim de que todos acreditassem por meio dele. Ele não era a luz, mas veio para dar testemunho da luz. Foi este o testemunho de João, quando os judeus lhe enviaram, de Jerusalém, sacerdotes e levitas, para lhe perguntarem: «Quem és tu?» Ele confessou a verdade e não negou; ele confessou: «Eu não sou o Messias». Eles perguntaram-lhe: «Então, quem és tu? És Elias?» «Não sou», respondeu ele. «És o Profeta?». Ele respondeu: «Não». Disseram-lhe então: «Quem és tu? Para podermos dar uma resposta àqueles que nos enviaram, que dizes de ti mesmo?» Ele declarou: «Eu sou a voz do que clama no deserto: ‘Endireitai o caminho do Senhor’, como disse o profeta Isaías». Entre os enviados havia fariseus que lhe perguntaram: «Então, porque baptizas, se não és o Messias, nem Elias, nem o Profeta?» João respondeu-lhes: «Eu baptizo em água, mas no meio de vós está Alguém que não conheceis: Aquele que vem depois de mim, a quem eu não sou digno de desatar a correia das sandálias». Tudo isto se passou em Betânia, além Jordão, onde João estava a baptizar.


«QUEM ÉS TU?»
Nenhum dos evangelistas tentou eludir a questão sobre a verdadeira identidade de João Baptista. A semana passada ouvimos o início da história do precursor contada pela boca de S. Marcos. Hoje é-nos proposta uma outra versão desse episódio, desta vez narrado pelo evangelista S. João.

O impacto que esta figura singular provocou nas gentes do seu tempo foi tão grande que desde o início da sua pregação alguns suspeitaram se não seria ele o messias. Após o martírio, a fama do Baptista aumentou incrivelmente. A história do profeta corajoso e temerário, cujo terrível destino seria selado tragicamente pela vaidade de Herodes e o dançar de Salomé, fascinou muitos israelitas e surgiram numerosos grupos e movimentos espirituais que se inspiraram na sua pregação de conversão e arrependimento (cfr. At 19,1-5). Ainda hoje no Iraque, a seita dos mandeístas venera João Baptista como messias e pratica o ritual do baptismo segundo a sua tradição.

Foram estes equívocos que levaram os quatro evangelistas a dedicar tanto espaço ao esclarecimento da identidade de João. O evangelho de hoje repete a mesma pergunta três vezes: «Quem és tu?». E todas as respostas esquivam qualquer afirmação que possa atrair a atenção sobre si. Ele não é um profeta, não é Elias e não é o messias. João Baptista é “somente” a voz.

A voz em si não é importante, pode até permanecer anónima. O que deve chamar a nossa atenção é a mensagem (a Palavra) que essa voz quer comunicar: «Preparai o caminho do Senhor, endireitai as suas veredas» (Mc 1,3).

Já começámos a preparar a Festa de Natal?
Enfeites, luzes, prendas, postais, a árvore, o presépio... É tudo muito bonito, mas oxalá não nos distraia do essencial. Preparar o caminho do Senhor significa abandonar comportamentos egoístas e atitudes injustas. Esquecer velhos ódios e rancores. Superar preconceitos e racismos. Renunciar às mentiras e aos enganos. Preparar o caminho do Senhor significa perdoar quem nos magoou, socorrer quem precisa de ajuda e libertar-se de todos os pesos e pecados que nos escravizam.

Senhor, ajuda-nos a viver bem este tempo de Advento, para que o teu Natal não seja uma festa estéril e vazia, mas sim, uma ocasião de encontro com o teu amor e com a tua Palavra: “Jesus Cristo”, vosso Filho, que é Deus convosco na unidade do Espírito Santo.


(tenham uma boa semana!)



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sábado, 6 de dezembro de 2008

2º DOMINGO DO ADVENTO (ano B)


Leitura do Livro de Isaías
(Is 40,1-5.9-11)
Consolai, consolai o meu povo, diz o vosso Deus. Falai ao coração de Jerusalém e dizei-lhe em alta voz que terminaram os seus trabalhos e está perdoada a sua culpa, porque recebeu da mão do Senhor duplo castigo por todos os seus pecados. Uma voz clama: «No deserto preparai o caminho do Senhor, abri na estepe uma estrada para o nosso Deus. Sejam alteados todos os vales e abatidos os montes e as colinas; endireitem-se os caminhos tortuosos e aplanem-se as veredas escarpadas. Então se manifestará a glória do Senior e todo o homem verá a sua magnificência, porque a boca do Senhor falou». Sobe ao alto dum monte, arauto de Sião! Grita com voz forte, arauto de Jerusalém! Levanta sem temor a tua voz e diz às cidades de Judá: «Eis o vosso Deus. O Senhor Deus vem com poder, o seu braço dominará. Com Ele vem o seu prémio, precede-O a sua recompensa. Como um pastor apascentará o seu rebanho e reunirá os animais dispersos; tomará os cordeiros em seus braços, conduzirá as ovelhas ao seu descanso».


SALMO RESPONSORIAL – Salmo 84 (85)
Refrão: Mostrai-nos o vosso amor e dai-nos a vossa salvação.

Escutemos o que diz o Senhor:
Deus fala de paz ao seu povo e aos seus fiéis.
A sua salvação está perto dos que O temem
e a sua glória habitará na nossa terra.

Encontraram-se a misericórdia e a fidelidade,
abraçaram-se a paz e a justiça.
A fidelidade vai germinar da terra
e a justiça descerá do Céu.

O Senhor dará ainda o que é bom
e a nossa terra produzirá os seus frutos.
A justiça caminhará à sua frente
e a paz seguirá os seus passos.


Leitura da Segunda Epístola de São Pedro
(2 Pedro 3,8-14)
Há uma coisa, caríssimos, que não deveis esquecer: um dia diante do Senhor é como mil anos e mil anos como um dia. O Senhor não tardará em cumprir a sua promessa, como pensam alguns. Mas usa de paciência para convosco e não quer que ninguém pereça, mas que todos possam arrepender-se. Entretanto, o dia do Senhor virá como um ladrão: nesse dia, os céus desaparecerão com fragor, os elementos dissolver-se-ão nas chamas e a terra será consumida com todas as obras que nela existem. Uma vez que todas as coisas serão assim dissolvidas, como deve ser santa a vossa vida e grande a vossa piedade, esperando e apressando a vinda do dia de Deus, em que os céus se dissolverão em chamas e os elementos se fundirão no ardor do fogo! Nós esperamos, segundo a promessa do Senhor, os novos céus e a nova terra, onde habitará a justiça. Portanto, caríssimos, enquanto esperais tudo isto, empenhai-vos, sem pecado nem motivo algum de censura, para que o Senhor vos encontre na paz.


Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Marcos
(Mc 1,1-8)
Princípio do Evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus. Está escrito no profeta Isaías: «Vou enviar à tua frente o meu mensageiro, que preparará o teu caminho. Uma voz clama no deserto: ‘Preparai o caminho do Senhor, endireitai as suas veredas’». Apareceu João Baptista no deserto a proclamar um baptismo de penitência para remissão dos pecados. Acorria a ele toda a gente da região da Judeia e todos os habitantes de Jerusalém e eram baptizados por ele no rio Jordão, confessando os seus pecados. João vestia-se de pêlos de camelo, com um cinto de cabedal em volta dos rins, e alimentava-se de gafanhotos e mel silvestre. E, na sua pregação, dizia: «Vai chegar depois de mim quem é mais forte do que eu, diante do qual eu não sou digno de me inclinar para desatar as correias das suas sandálias. Eu baptizo-vos na água, mas Ele baptizar-vos-á no Espírito Santo».


DESCUBRA AS DIFERENÇAS
Marcos inicia o seu Evangelho com um pequeno trecho do livro do profeta Isaías. Um extracto que a liturgia da palavra nos propõe na primeira leitura. Mas já viram como a citação não é exacta? Vejam lá se descobrem a diferença:

Uma voz clama: «No deserto preparai o caminho do Senhor» (Is 40,3)

Uma voz clama no deserto: «Preparai o caminho do Senhor» (Mc 1,3)

Encontraram? Para Marcos é «no deserto» que a voz clama, enquanto que para Isaías, a expressão «no deserto» já faz parte da mensagem gritada pela voz. Os textos originais da bíblia não conhecem a nossa pontuação moderna e por isso mesmo não vou perder tempo com uma análise da sintaxe dos textos originais. Para mim o importante é que tenham presente que existem estas duas interpretações diferentes. Duas versões que não se contradizem, mas que se complementam.

Quando se fala de deserto normalmente pensa-se numa terra árida e morta. A água é rara, a vegetação escassa e a vida é quase impossível. Mas do ponto de vista bíblico, o deserto traz à memória uma segunda imagem: depois da fuga da escravidão do Egipto, foi no deserto que os israelitas descobriram a liberdade e nasceram como povo. Foi lá que receberam a Lei e estabeleceram uma aliança com Deus. Apesar da sua aridez e das suas dificuldades, o deserto recorda um período de graça na história de Israel.

Para Marcos, a profecia do Antigo Testamento cumpre-se com a actividade de João Baptista. Ele é a voz que grita no deserto. No meio das dificuldades, do sofrimento, da aridez do deserto, eis que chega o anúncio do Evangelho, que em grego significa “Boa Notícia”.

Para Isaías, a Boa Notícia não só chega «no deserto», mas por causa (!) da experiência do deserto. Ninguém quer sofrer. Ninguém quer conhecer a aridez e a dureza do deserto. Mas essa experiência de sofrimento pode transformar-se em ocasião de graça, revelar à nossa vida um novo sentido, pode ser o momento do encontro com Jesus Cristo. Para Isaías é precisamente nas dificuldades e nas situações difíceis que devemos preparar «o caminho do Senhor».

O deserto é o lugar da solidão, da pobreza, da fragilidade humana. Nada nos pode distrair. Nada nos pode esconder. Estamos nus e sozinhos, mas a nossa solidão não é total. Despojados de tudo não podemos continuar a ignorar a Sua presença. Longe das distracções do mundo criam-se condições privilegiadas para escutar a Sua voz.

Deus disse e diz à humanidade uma única palavra: Jesus. Ele é o Verbo Incarnado, a Palavra que se fez carne e a única, verdadeira, Boa Notícia. Preparai os seus caminhos!

(tenham uma boa semana!)


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sábado, 29 de novembro de 2008

1º DOMINGO DO ADVENTO (ano B)



Leitura do Livro de Isaías
(Is 63,16b-17.19b; 64,2b-7)
Vós, Senhor, sois nosso Pai e nosso Redentor, desde sempre, é o vosso nome. Porque nos deixais, Senhor, desviar dos vossos caminhos e endurecer o nosso coração, para que não Vos tema? Voltai, por amor dos vossos servos e das tribos da vossa herança. Oh, se rasgásseis os céus e descêsseis! Ante a vossa face estremeceriam os montes! Mas Vós descestes e perante a vossa face estremeceram os montes. Nunca os ouvidos escutaram, nem os olhos viram que um Deus, além de Vós, fizesse tanto em favor dos que n’Ele esperam. Vós saís ao encontro dos que praticam a justiça e recordam os vossos caminhos. Estais indignado contra nós, porque pecámos e há muito que somos rebeldes, mas seremos salvos. Éramos todos como um ser impuro, as nossas acções justas eram todas como veste imunda. Todos nós caímos como folhas secas, as nossas faltas nos levavam como o vento. Ninguém invocava o vosso nome, ninguém se levantava para se apoiar em Vós, porque nos tínheis escondido o vosso rosto e nos deixáveis à mercê das nossas faltas. Vós, porém, Senhor, sois nosso Pai e nós o barro de que sois o Oleiro; somos todos obra das vossas mãos.


SALMO RESPONSORIAL – Salmo 79 (80)
Refrão: Senhor nosso Deus, fazei-nos voltar,
mostrai-nos o vosso rosto e seremos salvos.

Pastor de Israel, escutai,
Vós que estais sentado sobre os Querubins, aparecei.
Despertai o vosso poder
e vinde em nosso auxílio.

Deus dos Exércitos, vinde de novo,
olhai dos céus e vede, visitai esta vinha.
Protegei a cepa que a vossa mão direita plantou,
o rebento que fortalecestes para Vós.

Estendei a mão sobre o homem que escolhestes,
sobre o filho do homem que para Vós criastes;
e não mais nos apartaremos de Vós:
fazei-nos viver e invocaremos o vosso nome.


Leitura da Primeira Epístola do apóstolo São Paulo aos Coríntios
(1 Cor 1,3-9)
Irmãos: A graça e a paz vos sejam dadas da parte de Deus, nosso Pai, e do Senhor Jesus Cristo. Dou graças a Deus, em todo o tempo, a vosso respeito, pela graça divina que vos foi dada em Cristo Jesus. Porque fostes enriquecidos em tudo: em toda a palavra e em todo o conhecimento; e deste modo, tornou-se firme em vós o testemunho de Cristo. De facto, já não vos falta nenhum dom da graça, a vós que esperais a manifestação de Nosso Senhor Jesus Cristo. Ele vos tornará firmes até ao fim, para que sejais irrepreensíveis no dia de Nosso Senhor Jesus Cristo. Fiel é Deus, por quem fostes chamados à comunhão com seu Filho, Jesus Cristo, Nosso Senhor.


Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Marcos
(Mc 13,33-37)
Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: "Acautelai-vos e vigiai, porque não sabeis quando chegará o momento. Será como um homem que partiu de viagem: ao deixar a sua casa, deu plenos poderes aos seus servos, atribuindo a cada um a sua tarefa, e mandou ao porteiro que vigiasse. Vigiai, portanto, visto que não sabeis quando virá o dono da casa: se à tarde, se à meia-noite, se ao cantar do galo, se de manhãzinha; não se dê o caso que, vindo inesperadamente, vos encontre a dormir. O que vos digo a vós, digo-o a todos: Vigiai!"



A RAPOSA E O PRÍNCIPE
Este Domingo marca o início de um novo ano para a Igreja Católica Romana. É o primeiro Domingo de Advento (do latim Adventus, que significa “chegada”), o primeiro tempo do ano litúrgico, o qual antecede o Natal.

Por três vezes o evangelho desta semana exorta à vigilância. Vigiai! Vigiai! Vigiai! Uma insistência que pode muito bem enganar um leitor inexperiente... Quem é que deve chegar? É um amigo ou um inimigo? Devemos vigiar porque está para regressar um aliado ou alguém que nos aterroriza?

A parábola de hoje, lida só por ela poderia muito bem induzir no erro de dever esperar “com receio” a vinda de Jesus. Mas não nos podemos esquecer que esta parábola não foi escrita como um texto isolado mas está inserida num evangelho que propõe uma imagem muito clara de Deus e do seu Filho.

Quem deve regressar não é um senhor terrível e tirano, mas sim o Deus da Misericórdia e do Amor. Só quem já se apaixonou é que pode entender o tipo de espera e vigilância a que nos convida o evangelho. Nunca vos aconteceu ir espreitar à janela de dez em dez minutos, mesmo sabendo que ainda faltam duas horas para que o vosso amor chegue? Ou olhar para o telemóvel cinco vezes no espaço de meia hora, na esperança de encontrar uma mensagem ou uma chamada não atendida?

O tempo de Advento é o período da espera apaixonada que tão habilmente foi explicado pela raposa ao principezinho numa das mais belas páginas do famoso livro de Saint-Exupéry.

«(...) Se tu vens, por exemplo, às quatro da tarde, desde as três eu começarei a ser feliz. Quanto mais a hora for chegando, mais eu me sentirei feliz. Às quatro horas, então, estarei inquieta e agitada: descobrirei o preço da felicidade! Mas se tu vens a qualquer momento, nunca saberei a hora de preparar o coração (...)»

Eis o tempo de Advento! Eis a preparação ao Natal! Esperamos com emoção o Senhor que nos cativou, que conquistou o nosso coração e durante quatro semanas preparamos com alegria a nossa casa e o nosso coração para O poder acolher bem.

(tenham uma boa semana!)

PS: Se por acaso há já muito tempo não lêem o “Principezinho”, ou se nunca o leram (que vergonha!) basta clicar AQUI para tirar a barriga da miséria...



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domingo, 23 de novembro de 2008

SOLENIDADE DE NOSSO SENHOR JESUS CRISTO, REI DO UNIVERSO


Leitura da Profecia de Ezequiel
(Ez 34,11-12.15-17)
Eis o que diz o Senhor Deus: «Eu próprio irei em busca das minhas ovelhas e hei-de encontrá-las. Como o pastor vigia o seu rebanho, Quando estiver no meio das ovelhas que andavam tresmalhadas, para as tirar de todos os sítios em que se desgarraram num dia de nevoeiro e de trevas. Eu apascentarei as minhas ovelhas, Eu as levarei a repousar, diz o Senhor. Hei-de procurar a que anda tresmalhada. Tratarei a que estiver ferida, darei vigor à que andar enfraquecida E velarei pela gorda e vigorosa. Hei-de apascentá-las com justiça. Quanto a vós, meu rebanho, assim fala o Senhor Deus: Hei-de fazer justiça entre ovelhas e ovelhas, entre carneiros e cabritos».


SALMO RESPONSORIAL – Salmo 22 (23)
Refrão: O Senhor é meu pastor: nada me faltará.

O Senhor é meu pastor: nada me falta.
Leva-me a descansar em verdes prados,
conduz-me às águas refrescantes
e reconforta a minha alma.

Ele me guia por sendas direitas,
por amor do seu nome.
Ainda que tenha de andar por vales tenebrosos
não temerei nenhum mal, porque Vós estais comigo.

Para mim preparais a mesa
à vista dos meus adversários;
com óleo me perfumais a cabeça
e o meu cálice transborda.

A bondade e a graça hão-de acompanhar-me
todos os dias da minha vida,
e habitarei na casa do Senhor
para todo o sempre.



Leitura da Primeira Epístola do apóstolo São Paulo aos Coríntios
(1 Cor 15,20-26.28)
Irmãos: Cristo ressuscitou dos mortos, como primícias dos que morreram. Uma vez que a morte veio por um homem, também por um homem veio a ressurreição dos mortos; porque, do mesmo modo que em Adão todos morreram, assim também em Cristo serão todos restituídos à vida. Cada qual, porém, na sua ordem: primeiro, Cristo, como primícias; a seguir, os que pertencem a Cristo, por ocasião da sua vinda. Depois será o fim, quando Cristo entregar o reino a Deus seu Pai. É necessário que Ele reine, até que tenha posto todos os inimigos debaixo dos seus pés. E o último inimigo a ser aniquilado é a morte, porque Deus «tudo submeteu debaixo dos seus pés». Quando todas as coisas Lhe forem submetidas, então também o próprio Filho Se há-de submeter àquele que Lhe submeteu todas as coisas, para que Deus seja tudo em todos.


Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus
(Mt 25,31-46)
Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: «Quando o Filho do homem vier na sua glória com todos os seus Anjos, sentar-Se-á no seu trono glorioso. Todas as nações se reunirão na sua presença e Ele separará uns dos outros, como o pastor separa as ovelhas dos cabritos; e colocará as ovelhas à sua direita e os cabritos à sua esquerda. Então o Rei dirá aos que estiverem à sua direita: ‘Vinde, bem ditos de meu Pai; recebei como herança o reino que vos está preparado desde a criação do mundo. Porque tive fome e destes-Me de comer; tive sede e destes-me de beber; era peregrino e Me recolhestes; não tinha roupa e Me vestistes; estive doente e viestes visitar-Me; estava na prisão e fostes ver-Me’. Então os justos Lhe dirão: ‘Senhor, quando é que Te vimos com fome e Te demos de comer, ou com sede e Te demos de beber? Quando é que Te vimos peregrino e te recolhemos, ou sem roupa e Te vestimos? Quando é que Te vimos doente ou na prisão e Te fomos ver?’ E o Rei lhes responderá: ‘Em verdade vos digo: Quantas vezes o fizestes a um dos meus irmãos mais pequeninos, a Mim o fizestes’. Dirá então aos que estiverem à sua esquerda: ‘Afastai-vos de Mim, malditos, para o fogo eterno, preparado para o demónio e os seus anjos. Porque tive fome e não Me destes de comer; tive sede e não Me destes de beber; era peregrino e não Me recolhestes; estava sem roupa e não Me vestistes; estive doente e na prisão e não Me fostes visitar’. Então também eles Lhe hão-de perguntar: ‘Senhor, quando é que Te vimos com fome ou com sede, peregrino ou sem roupa, doente ou na prisão, e não Te prestámos assistência?’ E Ele lhes responderá: ‘Em verdade vos digo: Quantas vezes o deixastes de fazer a um dos meus irmãos mais pequeninos, também a Mim o deixastes de fazer’. Estes irão para o suplício eterno e os justos para a vida eterna».


????
No evangelho deste Domingo (o último deste ano litúrgico) encontramos quatro pontos de interrogação. Três na primeira parte da parábola e um na segunda. Não estão ali por acaso mas servem para ilustrar o “cair das nuvens” das pessoas que encontram o Rei. O elemento surpresa é parte integrante da mensagem de Jesus. Lembrem-se sempre que muitos dos que se acham “justos” hão-de descobrir-se indignos e que os últimos hão-de ser os primeiros.

Mas aquele ar espantado de que nos fala a parábola não é exclusivo dos que se descobrem longe da vontade do Pai. Aliás, vemos que Mateus decidiu dar um pouco mais de ênfase e espaço às perguntas (e à surpresa) dos que receberam a herança.

«Senhor, quando é que Te vimos com fome e Te demos de comer, ou com sede e Te demos de beber? Quando é que Te vimos peregrino e te recolhemos, ou sem roupa e Te vestimos? Quando é que Te vimos doente ou na prisão e Te fomos ver?»

Eles não sabiam. Não pensavam que estavam a ajudar Cristo. Não tinham os olhos colocados em nenhuma recompensa, mas agiam com espírito de pura gratuidade. Que nome podemos dar a este tipo de acção? Dou-vos duas sugestões: caridade (um termo que, infelizmente, hoje é quase sempre, erroneamente, associado ao dar uma “esmolinha”) ou então, amor. Eu prefiro este segundo.

O verdadeiro amor deve ser assim, tal como o encontramos na parábola deste Domingo: gratuito! Não é a ideia da herança que conduz a vida dos justos. Não foi por interesse que ajudaram os outros. Não foi para ganhar um prémio (parece-me que nem sabiam que havia um prémio!). O que fizeram não tinha segundos fins ou outros propósitos escondidos, mas eram guiados simplesmente pelo desejo de ajudar os que mais precisavam, de amar os irmãos mais necessitados.

Há pessoas que pensam que ser “bons cristãos” é dar muitas esmolas, mas a nossa fé é intensamente mais bonita e profunda. Quando ajudamos alguém não o podemos fazer por “obrigação” (porque somos cristão...), ou porque achamos que assim vamos poder “comprar” a nossa salvação, a nossa parte da herança. Essa não é a vontade do Pai. O que Ele quer é que nós nos amemos uns aos outros. Mas o verdadeiro amor (não se esqueçam!) é livre e gratuito. Gratuito ao ponto de se surpreender quando recebe uma recompensa.



(tenham uma boa semana!)


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sábado, 15 de novembro de 2008

XXXIII DOMINGO DO TEMPO COMUM (ano A)


Leitura do Livro dos Provérbios
(Prov 31,10-13.19-20.30-31)
Quem poderá encontrar uma mulher virtuosa? O seu valor é maior que o das pérolas. Nela confia o coração do marido, e jamais lhe falta coisa alguma. Ela dá-lhe bem-estar e não desventura, em todos os dias da sua vida. Procura obter lã e linho e põe mãos ao trabalho alegremente. Toma a roca em suas mãos, seus dedos manejam o fuso. Abre as mãos ao pobre e estende os braços ao indigente. A graça é enganadora e vã a beleza; a mulher que teme o Senhor é que será louvada. Dai-lhe o fruto das suas mãos, e suas obras a louvem às portas da cidade.


SALMO RESPONSORIAL – Salmo 127
Refrão: Ditoso o que segue o caminho do Senhor.

Feliz de ti que temes o Senhor
e andas nos seus caminhos.
Comerás do trabalho das tuas mãos,
serás feliz e tudo te correrá bem.

Tua esposa será como videira fecunda,
no íntimo do teu lar;
teus filhos serão como ramos de oliveira,
ao redor da tua mesa.

Assim será abençoado o homem que teme o Senhor.
De Sião te abençoe o Senhor:
vejas a prosperidade de Jerusalém,
todos os dias da tua vida.


Leitura da Primeira Epístola do apóstolo São Paulo aos Tessalonicenses
(1 Tes 5,1-6)
Irmãos: Sobre o tempo e a ocasião, não precisais que vos escreva, pois vós próprios sabeis perfeitamente que o dia do Senhor vem como um ladrão nocturno. E quando disserem: «Paz e segurança», é então que subitamente cairá sobre eles a ruína, como as dores da mulher que está para ser mãe, e não poderão escapar. Mas vós, irmãos, não andeis nas trevas, de modo que esse dia vos surpreenda como um ladrão, porque todos vós sois filhos da luz e filhos do dia: nós não somos da noite nem das trevas. Por isso, não durmamos como os outros, mas permaneçamos vigilantes e sóbrios.

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus
(Mt 25,14-30)
Naquele tempo, Disse Jesus aos seus discípulos a seguinte parábola: «Um homem, ao partir de viagem, chamou os seus servos e confiou-lhes os seus bens. A um entregou cinco talentos, a outro dois e a outro um, conforme a capacidade de cada qual; e depois partiu. O que tinha recebido cinco talentos fê-los render e ganhou outros cinco. Do mesmo modo, o que recebera dois talentos ganhou outros dois. Mas, o que recebera um só talento foi escavar na terra e escondeu o dinheiro do seu senhor. Muito tempo depois, chegou o senhor daqueles servos e foi ajustar contas com eles. O que recebera cinco talentos aproximou-se e apresentou outros cinco, dizendo: ‘Senhor, confiaste-me cinco talentos: aqui estão outros cinco que eu ganhei’. Respondeu-lhe o senhor: ‘Muito bem, servo bom e fiel. Porque foste fiel em coisas pequenas, confiar-te-ei as grandes. Vem tomar parte na alegria do teu senhor’. Aproximou-se também o que recebera dois talentos e disse: ‘Senhor, confiaste-me dois talentos: aqui estão outros dois que eu ganhei’. Respondeu-lhe o senhor: ‘Muito bem, servo bom e fiel. Porque foste fiel em coisas pequenas, confiar-te-ei as grandes. Vem tomar parte na alegria do teu senhor’. Aproximou-se também o que recebera um só talento e disse: ‘Senhor, eu sabia que és um homem severo, que colhes onde não semeaste e recolhes onde nada lançaste. Por isso, tive medo e escondi o teu talento na terra. Aqui tens o que te pertence’. O senhor respondeu-lhe: ‘Servo mau e preguiçoso, sabias que ceifo onde não semeei e recolho onde nada lancei; devias, portanto, depositar no banco o meu dinheiro e eu teria, ao voltar, recebido com juro o que era meu. Tirai-lhe então o talento e dai-o àquele que tem dez. Porque, a todo aquele que tem, dar-se-á mais e terá em abundância; mas, àquele que não tem, até o pouco que tem lhe será tirado. Quanto ao servo inútil, lançai-o às trevas exteriores. Aí haverá choro e ranger de dentes’».

ÓPIO DO POVO
Muitos devem estar a perguntar-se: «Mas porque é que o senhor dos servos não deu o mesmo número de talentos a cada um?». Antes de começarmos todos a chorar pelo “pobre” servo que recebeu poucochinho, é bom que saibamos o que é um talento. Um talento não é uma moeda, mas uma unidade de peso. No tempo de Jesus, um “talento” correspondia, mais ou menos, a 36 quilos de prata, ou seja, o salário de aproximadamente 3000 dias de trabalho de um operário não qualificado. O último servo recebeu menos, mas não recebeu pouco. Foi lhe dada a oportunidade de administrar uma verdadeira fortuna.

O que distingue os servos da parábola não é a quantidade de talentos que receberam, mas sim a decisão que tomaram. A questão que o evangelho de hoje propõe é a seguinte: o que andas a fazer com os dons que recebeste?

Infelizmente, por medo e cobardia muitas pessoas demitem-se do próprio papel na construção de um mundo melhor. São pessoas que enterram os talentos na terra e vivem uma vida tranquila e sem riscos. Não fazem mal a uma mosca, mas também não ajudam ninguém. Vivem a própria “vidinha” refugiados num cantinho seguro e tranquilo. Tão seguro e tranquilo quanto a covinha que fizeram para esconder os próprios dons.

A parábola de hoje é a resposta a todos aqueles que acreditam que a religião seja uma distracção para que as pessoas não lutem por uma sociedade mais justa, ou como dizia Karl Marx, o “ópio do povo”. Os servos trabalhadores testemunham a atitude radicalmente diversa e o espírito empreendedor que deve animar cada um de nós. Eles tiveram a ousadia de não se contentar com o que já tinham. Não se deixaram dominar pelo comodismo e pela apatia. Lutaram, esforçaram-se, arriscaram, ganharam.

Na vida é preciso arriscar. Temos que trabalhar e dar o nosso melhor se queremos construir alguma coisa. O nosso esforço e empenho nem sempre garantem o nosso sucesso: por vezes trabalhamos muito e mesmo assim não obtemos o que queríamos. Mas é preciso aceitar esta realidade, porque pior que arriscar e perder é nem sequer arriscar com medo de não ganhar.


(tenham uma boa semana!)


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sábado, 8 de novembro de 2008

FESTA DA DEDICAÇÃO DA BASÍLICA DE LATRÃO - 9 de Novembro

Leitura da Profecia de Ezequiel
(Ez 47,1-2.8-9.12)
Naqueles dias, o Anjo reconduziu-me à entrada do templo. Depois do limiar da porta saía água em direcção ao Oriente, pois a fachada do templo estava voltada para o Oriente. As águas corriam da parte inferior, do lado direito do templo, ao sul do altar. O Anjo fez-me sair pela porta setentrional e contornar o templo por fora, até à porta exterior que está voltada para o Oriente. As águas corriam do lado direito. O Anjo disse-me: «Esta água corre para a região oriental, desce para Arabá e entra no mar, para que as suas águas se tornem salubres. Todo o ser vivo que se move na água onde chegar esta torrente terá novo alento e o peixe será mais abundante. Porque aonde esta água chegar, tornar-se-ão sãs as outras águas e haverá vida por toda a parte aonde chegar esta torrente. À beira da torrente, nas duas margens, crescerá toda a espécie de árvores de fruto; a sua folhagem não murchará, nem acabarão os seus frutos. Todos os meses darão frutos novos, porque as águas vêm do santuário. Os frutos servirão de alimento e as folhas de remédio».


SALMO RESPONSORIAL – Salmo 45 (46)
Refrão: Os braços dum rio alegram a cidade de Deus, a morada santa do Altíssimo.

Deus é o nosso refúgio e a nossa força,
auxílio sempre pronto na adversidade.
Por isso nada receamos ainda que a terra vacile
e os montes se precipitem no fundo do mar.

Os braços dum rio alegram a cidade de Deus,
a mais santa das moradas do Altíssimo.
Deus está no meio dela e a torna inabalável,
Deus a protege desde o romper da aurora.

O Senhor dos Exércitos está connosco,
o Deus de Jacob é a nossa fortaleza.
Vinde e contemplai as obras do Senhor,
as maravilhas que realizou na terra.


Leitura da Primeira Epístola do apóstolo São Paulo aos Coríntios
(1 Cor 3,9c-11.16-17)
Irmãos: Vós sois edifício de Deus. Segundo a graça de Deus que me foi dada, eu, como sábio arquitecto, coloquei o alicerce e outro levanta o edifício. Veja cada um como constrói: ninguém pode colocar outro alicerce além do que está posto, que é Jesus Cristo. Não sabeis que sois templo de Deus e que o Espírito de Deus habita em vós? Se alguém destrói o templo de Deus, Deus o destruirá. Porque o templo de Deus é santo e vós sois esse templo.


Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São João
(Jo 2,13-22)
Estava próxima a Páscoa dos judeus e Jesus subiu a Jerusalém. Encontrou no templo os vendedores de bois, de ovelhas e de pombas e os cambistas sentados às bancas. Fez então um chicote de cordas e expulsou-os a todos do templo, com as ovelhas e os bois; deitou por terra o dinheiro dos cambistas e derrubou-lhes as mesas; e disse aos que vendiam pombas: «Tirai tudo isto daqui; não façais da casa de meu Pai casa de comércio». Os discípulos recordaram-se do que estava escrito: «Devora-me o zelo pela tua casa». Então os judeus tomaram a palavra e perguntaram-Lhe: «Que sinal nos dás de que podes proceder deste modo?». Jesus respondeu-lhes: «Destruí este templo e em três dias o levantarei». Disseram os judeus: «Foram precisos quarenta e seis anos para construir este templo e Tu vais levantá-lo em três dias?». Jesus, porém, falava do templo do seu Corpo. Por isso, quando Ele ressuscitou dos mortos, os discípulos lembraram-se do que tinha dito e acreditaram na Escritura e na palavra de Jesus.


As igrejas e a Igreja
A liturgia dominical desta semana é substituída por uma festa que recorda a dedicação (ou consagração) daquela que é considerada a “mãe” de todas as igrejas e uma das catedrais mais bonitas do mundo: a Basílica de S. João de Latrão. Muitas pessoas pensam que a basílica de S. Pedro seja a catedral do Papa, mas enganam-se. A catedral de Roma é S. João de Latrão e portanto, nesta festa convido-vos a reflectir sobre dois temas: o sentido do “templo” para a nossa fé cristã e o papel fundamental que Roma tem na Igreja Católica.

No evangelho deste Domingo vemos Jesus que defende a sacralidade do templo de Deus mas ao mesmo tempo revela-se como o “novo templo”, o novo lugar onde os homens podem fazer a experiência do encontro com Deus. No quarto capítulo do evangelho de João, Jesus diz à samaritana que chegou a hora de adorar o Pai, não no templo de Jerusalém, mas sim no próprio coração «em espírito e verdade» (Jo 4, 24). Cristo é o verdadeiro templo de Deus e com o mistério da Sua incarnação é anulada a divisão entre o sagrado e o profano. Todos os homens, todos os lugares, todos os tempos são consagrados a Deus e é restabelecida a união e harmonia existentes no início da Criação.

Mas se cada um de nós pode adorar Deus no próprio coração (e portanto, na própria casa) porque é que se continua a dar tanta importância à igreja-edifício? Porque é que se continua a dizer que é importante participar aos Domingos na celebração da eucaristía?

A resposta é simples: Jesus não veio ao mundo para nos salvar separados, mas sim, para formar um povo, uma comunidade, uma família. Já nos esquecemos do evangelho do XXIII Domingo? «Onde dois ou três estão reunidos em meu nome, Eu estou no meio deles» (Mt 18,20). As igrejas (com letra minúscula) são importantes principalmente porque são os locais onde se reúne a Igreja (com letra maiúscula), a assembleia (ecclesia) dos que acreditam em Cristo.

Dizia esta semana o padre Raniero Cantalamessa que, ignorar a Igreja (fundada por Cristo) e os sacramentos (instituídos por Cristo) é cultivar uma fé “bricolage” exposta ao subjectivismo mais absoluto. Se não nos confrontamos com mais ninguém, Deus realmente reduz-se a uma projecção dos desejos e necessidades do homem, tal como defendia o filósofo ateu Feuerbach. Já não é Deus quem cria o homem à Sua imagem, mas o homem cria um deus à sua imagem. Mas é um deus que não nos pode salvar.

E agora pergunto-vos: que garantia temos que este pequeno comentário não seja apenas o fruto da minha interpretação subjectiva do evangelho? Quem vos garante que eu não esteja a criar um “deus” à minha imagem e semelhança? Também neste caso a resposta não é complicada. Celebrando a festa da Catedral de Roma, recordamos a importância da união na Igreja. É a comunhão com a igreja de Pedro que garante a interpretação católica do evangelho de Cristo. É a comunhão com Roma que assegura a continuidade entre a Palavra, pronunciada por Cristo, e as palavras que utilizamos hoje para anunciar o Evangelho.


(tenham uma boa semana!)



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sábado, 1 de novembro de 2008

COMEMORAÇÃO DE TODOS OS FIÉIS DEFUNTOS – 2 de Novembro

(leituras da terceira missa)


Leitura do Livro de Isaías
(Is 25,6a.7-9)
Sobre este monte, o Senhor do Universo há-de preparar para todos os povos um banquete de manjares suculentos. Sobre este monte, há-de tirar o véu que cobria todos os povos, o pano que envolvia todas as nações; Ele destruirá a morte para sempre.O Senhor Deus enxugará as lágrimas de todas as faces e fará desaparecer da terra inteira o opróbrio que pesa sobre o seu povo. Porque o Senhor falou. Dir-se-á naquele dia: «Eis o nosso Deus, de quem esperávamos a salvação; é o Senhor, em quem pusemos a nossa confiança. Alegremo-nos e rejubilemos, porque nos salvou.



SALMO RESPONSORIAL – Salmo 22 (23)
Refrão: O Senhor é meu pastor: nada me faltará.

O Senhor é meu pastor: nada me falta.
Leva-me a descansar em verdes prados,
conduz-me às águas refrescantes
e reconforta a minha alma.

Ele me guia por sendas direitas por amor do seu nome.
Ainda que tenha de andar por vales tenebrosos,
não temerei nenhum mal, porque Vós estais comigo:
o vosso cajado e o vosso báculo me enchem de confiança.

Para mim preparais a mesa
à vista dos meus adversários;
com óleo me perfumais a cabeça,
e o meu cálice transborda.

A bondade e a graça hão-de acompanhar-me
todos os dias da minha vida
e habitarei na casa do Senhor
para todo o sempre.


Leitura da Primeira Epístola do apóstolo São Paulo aos Tessalonicenses
(1 Tes 4,13-18)
Não queremos, irmãos, deixar-vos na ignorância a respeito dos defuntos, para não vos contristardes como os outros, que não têm esperança. Se acreditamos que Jesus morreu e ressuscitou, do mesmo modo, Deus levará com Jesus os que em Jesus tiverem morrido. Eis o que temos para vos dizer, segundo a palavra do Senhor: Nós, os vivos, os que ficarmos para a vinda do Senhor, não precederemos os que tiverem morrido. Ao sinal dado, à voz do Arcanjo e ao som da trombeta divina, o próprio Senhor descerá do Céu e os mortos em Cristo ressuscitarão primeiro. Em seguida, nós, os vivos, os que tivermos ficado, seremos arrebatados juntamente com eles sobre as nuvens, para irmos ao encontro do Senhor nos ares, e assim estaremos sempre com o Senhor. Consolai-vos uns aos outros com estas palavras.


Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São João
(Jo 6,51-58)
Naquele tempo, disse Jesus à multidão: «Eu sou o pão vivo que desceu do Céu. Quem comer deste pão viverá eternamente. E o pão que Eu hei-de dar é minha carne, que Eu darei pela vida do mundo». Os judeus discutiam entre si: «Como pode Ele dar-nos a sua carne a comer?» Jesus disse-lhes: «Em verdade, em verdade vos digo: Se não comerdes a carne do Filho do homem e não beberdes o seu sangue, não tereis a vida em vós. Quem come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna; e Eu o ressuscitarei no último dia. A minha carne é verdadeira comida e o meu sangue é verdadeira bebida. Quem come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em Mim e Eu nele. Assim como o Pai, que vive, Me enviou e Eu vivo pelo Pai, também aquele que Me come viverá por Mim. Este é o pão que desceu do Céu; não é como o dos vossos pais, que o comeram e morreram: Quem comer deste pão viverá eternamente».


VIVER SEM MEDO
Há alguns anos atrás, durante um curso de formação para catequistas, um dos participantes partilhou a seguinte experiência: «Sempre me considerei uma pessoa de fé. Vou à missa todos os Domingos desde que tenho idade para me lembrar e comecei o meu serviço como catequista logo após o meu crisma. Não me lembro de alguma vez ter duvidado da existência de Deus ou do Seu amor por nós... mas na semana passada fui a um funeral. A irmã de uma minha amiga tinha morrido. Tentei encontrar alguma palavra que a pudesse confortar. Procurei na minha fé, na minha experiência de catequista, algo que aliviasse (pelo menos um pouco) aquele sofrimento. Mas acabei por ficar em silêncio. Todas as palavras me pareciam inúteis. Senti que a fé, pela primeira vez, não era capaz de dar-me uma resposta. Senti que a morte era mais forte do que a minha fé».

E concluiu com a pergunta: «O que é que nós cristãos podemos dizer ao mundo sobre a morte?»

Depois de alguns momentos de silêncio, resolvemos seguir um dos conselhos que já tínhamos ouvido naquele curso: partir do Evangelho e procurar na vida de Jesus as respostas para as nossas questões.

Acabámos por nos concentrar na obra de Lucas, na narração dos últimos momentos da paixão de Jesus (capítulo 23). São páginas muito duras. Aos olhos do mundo a Sua morte é um fracasso absoluto. Tudo o que Ele fez, tudo o que Ele disse não serviu de nada. Abandonado... torturado... derrotado em todos os sentidos. Até um dos dois malfeitores crucificados com Ele, começa a provocá-Lo:

«Se és o Cristo, salva-te a ti mesmo e salva-nos a nós!» Mas o outro repreendeu-o: «Nem sequer temes a Deus, tu que sofres no mesmo suplício? Para nós isto é justo: recebemos o que mereceram os nossos crimes, mas este não fez mal algum». E acrescentou: «Jesus, lembra-te de mim, quando tiveres entrado no teu Reino!» Jesus respondeu-lhe: «Em verdade te digo: hoje estarás comigo no paraíso». (Lc 23,39-43)

Foi nesta resposta que encontrámos algum conforto. Mais precisamente, na palavra “hoje”. Jesus não fala de purgatório, de juízo final ou de “um dia”...
«Hoje estarás comigo no paraíso». Hoje! O homem não foi feito para a morte e a morte não pode aprisionar o homem. O caminho que percorremos nesta terra não é um drama absurdo, sem sentido e sem finalidade que termina no fracasso e na morte. Hoje irás entrar na vida eterna! Não devemos ter medo. Volto a repetir: não tenham medo! A morte chega para todos, mas o projecto de Deus para o homem é um projecto de vida. No nosso horizonte final não está o “nada”, mas sim a comunhão com o Pai, a realização plena do homem, a felicidade definitiva e a vida eterna.


(tenham uma boa semana!)



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sábado, 25 de outubro de 2008

XXX DOMINGO DO TEMPO COMUM (ano A)



Leitura do Livro do Êxodo
(Ex 22,20-26)
Eis o que diz o Senhor: «Não prejudicarás o estrangeiro, nem o oprimirás, porque vós próprios fostes estrangeiros na terra do Egipto. Não maltratarás a viúva nem o órfão. Se lhes fizeres algum mal e eles clamarem por Mim, escutarei o seu clamor;inflamar-se-á a minha indignação e matar-vos-ei ao fio da espada. As vossas mulheres ficarão viúvas, e órfãos os vossos filhos. Se emprestares dinheiro a alguém do meu povo, ao pobre que vive junto de ti, não procederás com ele como um usurário, sobrecarregando-o com juros. Se receberes como penhor a capa do teu próximo, terás de lha devolver até ao pôr do sol, pois é tudo o que ele tem para se cobrir, é o vestuário com que cobre o seu corpo. Com que dormiria ele? Se ele Me invocar, escutá-lo-ei, porque sou misericordioso».



SALMO RESPONSORIAL – Salmo 17 (18)
Refrão: Eu vos amo, Senhor: sois a minha força.

Eu Vos amo, Senhor, minha força,
minha fortaleza, meu refúgio e meu libertador.
Meu Deus, auxílio em que ponho a minha confiança,
meu protector, minha defesa e meu salvador.

Na minha aflição invoquei o Senhor
e clamei pelo meu Deus.
Do seu templo Ele ouviu a minha voz,
e o meu clamor chegou aos seus ouvidos.

Viva o Senhor, bendito seja o meu protector;
exaltado seja Deus, meu salvador.
O Senhor dá ao Rei grandes vitórias
e usa de bondade para com o seu ungido.



Leitura da Primeira Epístola do apóstolo São Paulo aos Tessalonicenses
(1 Tes 1,5c-10)
Irmãos: Vós sabeis como procedemos no meio de vós, para vosso bem. Tornaste-vos imitadores nossos e do Senhor, recebendo a palavra no meio de muitas tribulações, com a alegria do Espírito Santo; e assim vos tornastes exemplo para todos os crentes da Macedónia e da Acaia. Porque, partindo de vós, a palavra de Deus ressoou não só na Macedónia e na Acaia, mas em toda a parte se divulgou a vossa fé em Deus, de modo que não precisamos de falar sobre ela. De facto, são eles próprios que relatam o acolhimento que tivemos junto de vós e como dos ídolos vos convertestes a Deus, para servir ao Deus vivo e verdadeiro e esperar dos Céus o seu Filho, a quem ressuscitou dos mortos: Jesus, que nos livrará da ira que há-de vir.



Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus
(Mt 22,34-40)
Naquele tempo, os fariseus, ouvindo dizer que Jesus tinha feito calar os saduceus, reuniram-se em grupo, e um doutor da Lei perguntou a Jesus, para O experimentar: «Mestre, qual é o maior mandamento da Lei?». Jesus respondeu: «‘Amarás o Senhor, teu Deus, com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todo o teu espírito’. Este é o maior e o primeiro mandamento. O segundo, porém, é semelhante a este: ‘Amarás o teu próximo como a ti mesmo’. Nestes dois mandamentos se resumem toda a Lei e os Profetas».


A CLAVE MUSICAL
Depois da controvérsia sobre o tributo a César, a classe dirigente de Jerusalém continua à procura de argumentos que assegurem a pena capital no processo a Jesus Cristo. No Evangelho deste Domingo vemos como os fariseus procuram colocá-Lo em dificuldade com a delicada questão sobre o valor e a prioridade dos mandamentos. Naquele tempo este tema era objecto de debates intermináveis entre os fariseus e os doutores da Lei. A preocupação obsessiva em actualizar a Lei, de forma a que ela respondesse a todas as questões que a vida do dia a dia punha, tinha levado os doutores da Lei a deduzir um conjunto de 613 preceitos: 365 proibições e 248 acções a pôr em prática.

Para os fariseus o mandamento mais importante era o repouso do Sábado e a transgressão desta regra devia ser punida com a morte. Apesar de serem históricos adversários, os fariseus, saduceus, escribas e doutores da Lei conseguem esquecer momentaneamente as próprias diferenças e unir-se contra Jesus. Pactuam com esta resposta pois recordam bem o que Ele ensinou quando “ousou” curar alguém no sétimo dia: «O Sábado foi feito para o homem, e não o homem para o Sábado» (Mc 2,27).

Mas a resposta de Jesus segue uma outra linha que surpreende os fariseus e supera o horizonte estreito da pergunta, indo muito mais além, ao nível das opções profundas que o homem deve fazer. Ele cita o livro do Deuteronómio, onde se fala da nossa relação com Deus (Dt 6,5) e o livro do Levítico, no que diz respeito à nossa relação com os outros (Lv 19,18). Na Sua perspectiva, “amor a Deus” e “amor aos irmãos” estão intimamente associados. Não são dois mandamentos diversos, mas duas faces da mesma moeda e a raiz de todos os mandamentos.

Ainda hoje continuamos a viver a tentação de legislar todas as acções possíveis ao homem. Se pareciam demasiados os 613 preceitos da fé hebraica, então o que pensar dos 1752 cânones do Direito Canónico da Igreja Católica? Obviamente a questão mais importante não é o número de regras que nos damos (quem tem mais; quem tem menos...) mas sim qual a lógica que iluminará todos esses mandamentos. Tal como numa composição musical, a clave dá o nome a cada uma das notas na pauta, no caso da fé cristã é o amor a Deus e o amor ao próximo que dão sentido à nossa lei.

Por toda a parte se ouvem debates importantes sobre temas actuais e algumas regras da Igreja.
Fala-se muito, por exemplo, do uso dos contraceptivos, das relações sexuais pré-matrimoniais, da questão do divórcio, do celibato dos sacerdotes, etc.
Mas atenção: nunca teremos uma resposta verdadeiramente cristã se primeiro não conseguirmos interiorizar os dois mandamentos que dão sentido a tudo o resto: amar a Deus e amar o próximo.


(tenham uma boa semana!)



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sábado, 18 de outubro de 2008

XXIX DOMINGO DO TEMPO COMUM (ano A)


Leitura do Livro de Isaías
(Is 45,1.4-6)
Assim fala o Senhor a Ciro, seu ungido, a quem tomou pela mão direita, para subjugar diante dele as nações e fazer cair as armas da cintura dos reis, para abrir as portas à sua frente, sem que nenhuma lhe seja fechada: «Por causa de Jacob, meu servo, e de Israel, meu eleito, Eu te chamei pelo teu nome e te dei um título glorioso, quando ainda não Me conhecias. Eu sou o Senhor e não há outro; fora de Mim não há Deus. Eu te cingi, quando ainda não Me conhecias, para que se saiba, do Oriente ao Ocidente, que fora de Mim não há outro. Eu sou o Senhor e mais ninguém».



SALMO RESPONSORIAL – Salmo 95 (96)
Refrão: Aclamai a glória e o poder do Senhor.

Cantai ao Senhor um cântico novo,
cantai ao Senhor, terra inteira.
Publicai entre as nações a sua glória
em todos os povos as suas maravilhas.

O Senhor é grande e digno de louvor,
mais temível que todos os deuses.
Os deuses dos gentios não passam de ídolos,
foi o Senhor quem fez os céus.

Dai ao Senhor, ó família dos povos,
dai ao Senhor glória e poder.
Dai ao Senhor a glória do seu nome,
levai-Lhe oferendas e entrai nos seus átrios.

Adorai o Senhor com ornamentos sagrados,
trema diante d’Ele a terra inteira.
Dizei entre as nações: «O Senhor é rei»,
governa os povos com equidade.



Leitura da Primeira Epístola do apóstolo São Paulo aos Tessalonicenses
(1 Tes 1,1-5b)
Paulo, Silvano e Timóteo à Igreja dos Tessalonicenses, que está em Deus Pai e no Senhor Jesus Cristo: A graça e a paz estejam convosco. Damos continuamente graças a Deus por todos vós, ao fazermos menção de vós nas nossas orações. Recordamos a actividade da vossa fé, o esforço da vossa caridade e a firmeza da vossa esperança em Nosso Senhor Jesus Cristo, na presença de Deus, nosso Pai. Nós sabemos, irmãos amados por Deus, como fostes escolhidos. O nosso Evangelho não vos foi pregado somente com palavras, mas também com obras poderosas, com a acção do Espírito Santo.



Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus
(Mt 22,15-21)
Naquele tempo, os fariseus reuniram-se para deliberar sobre a maneira de surpreender Jesus no que dissesse. Enviaram-Lhe alguns dos seus discípulos, juntamente com os herodianos, e disseram-Lhe: «Mestre, sabemos que és sincero e que ensinas, segundo a verdade, o caminho de Deus, sem Te deixares influenciar por ninguém, pois não fazes acepção de pessoas. Diz-nos o teu parecer: É lícito ou não pagar tributo a César?». Jesus, conhecendo a sua malícia, respondeu: «Porque Me tentais, hipócritas? Mostrai-me a moeda do tributo». Eles apresentaram-Lhe um denário, e Jesus perguntou:«De quem é esta imagem e esta inscrição?». Eles responderam: «De César». Disse-lhes Jesus: «Então, dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus».


FÉ E POLÍTICA
A classe dirigente do povo judeu decidiu em segredo que é necessário eliminar Jesus. Têm que prendê-lo, processá-lo e condená-lo à morte. Mas é preciso preparar bem a acusação para que não aconteça que saia ilibado. É necessário encontrar argumentos que confirmem em tribunal a imagem do galileu agitador e revolucionário. Resolvem tecer uma armadilha que toca um dos temas mais delicados daquela época: o pagamento do tributo ao imperador de Roma.

A Palestina tinha sido ocupada pelo Império Romano desde 63 a.C. e todos os habitantes eram obrigados a pagar esta humilhante taxa, símbolo de sujeição a César. Se Jesus se pronunciasse a favor do pagamento do tributo, seria acusado de colaboracionismo, mas se se pronunciasse contra o pagamento do imposto, seria acusado de sedição e condenado como inimigo da ordem romana.

«A César o que é de César e a Deus o que é de Deus». A resposta de Jesus supera o nível da pergunta apresentada e vai à origem profunda da questão. É uma afirmação que nos propõe o controverso problema da relação entre a fé e as realidades terrenas, neste caso particular, entre a fé e a política.

Na Bíblia não podemos encontrar um programa de governo, um sistema económico ou uma teoria científica. Deus trata-nos como adultos e confia que os seus filhos tenham inteligência e capacidade para gerir a Sua maravilhosa Criação, sem que Ele tenha de intervir a cada momento e pronunciar-se sobre todos os argumentos. Não podemos apelarmo-nos à Santíssima Trindade para impor as nossas opiniões políticas ou procurar na Palavra revelada se devemos ou não aprovar uma determinada medida económica. As realidades mundanas merecem a própria autonomia e palavras como “deus” ou “bíblia” não podem ser usadas como armas quando não conseguimos fazer valer as nossas ideias.

Mas isto não significa que os cristãos possam refugiar-se numa fé desincarnada e alienar-se do diálogo que constrói a sociedade civil. É preciso tomar posições e denunciar erros e injustiças. O mundo precisa que coloquemos as nossas capacidades e preparação ao serviço da humanidade e que através do diálogo inteligente consigamos iluminar as realidades terrenas com a luz do Evangelho.

O mundo pensa que o centro da economia é o lucro, mas nós acreditamos que ao centro deve estar o homem.
A ciência diz que tudo o que é possível é lícito, mas nós acreditamos no respeito pelo homem e pela vida humana.
A política ensina que se pode impor a razão com o uso da força, mas nós acreditamos que só através do diálogo e do exemplo se possa transformar o mundo.



(tenham uma boa semana!)


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sábado, 11 de outubro de 2008

XXVIII DOMINGO DO TEMPO COMUM (ano A)




Leitura do Livro de Isaías
(Is 25,6-10ª)
Sobre este monte, o Senhor do Universo há-de preparar para todos os povos um banquete de manjares suculentos, um banquete de vinhos deliciosos: comida de boa gordura, vinhos puríssimos. Sobre este monte, há-de tirar o véu que cobria todos os povos, o pano que envolvia todas as nações; destruirá a morte para sempre. O Senhor Deus enxugará as lágrimas de todas as faces e fará desaparecer da terra inteira o opróbrio que pesa sobre o seu povo. Porque o Senhor falou. Dir-se-á naquele dia: «Eis o nosso Deus, de quem esperávamos a salvação; é o Senhor, em quem pusemos a nossa confiança. Alegremo-nos e rejubilemos, porque nos salvou. A mão do Senhor pousará sobre este monte».



SALMO RESPONSORIAL – Salmo 22 (23)
Refrão: Habitarei para sempre na casa do Senhor.

O Senhor é meu pastor: nada me falta.
Leva-me a descansar em verdes prados,
conduz-me às águas refrescantes
e reconforta a minha alma.

Ele me guia por sendas direitas, por amor do seu nome.
Ainda que tenha de andar por vales tenebrosos,
não temerei nenhum mal, porque Vós estais comigo:
o vosso cajado e o vosso báculo me enchem de confiança.

Para mim preparais a mesa,
à vista dos meus adversários;
com óleo me perfumais a cabeça,
e o meu cálice transborda.

A bondade e a graça hão-de acompanhar-me
todos os dias da minha vida,
e habitarei na casa do Senhor
para todo o sempre.



Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos Filipenses
(Filip 4,12-14.19-20)
Irmãos: Sei viver na pobreza e sei viver na abundância. Em todo o tempo e em todas as circunstâncias, tenho aprendido a ter fartura e a passar fome, a viver desafogadamente e a padecer necessidade. Tudo posso n’Aquele que me conforta. No entanto, fizestes bem em tomar parte na minha aflição. O meu Deus proverá com abundância a todas as vossas necessidades, Segundo a sua riqueza e magnificência, em Cristo Jesus. Glória a Deus, nosso Pai, pelos séculos dos séculos. Amen.



Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus
(Mt 22,1-14 forma breve)
Naquele tempo, Jesus dirigiu-Se de novo aos príncipes dos sacerdotes e aos anciãos do povo e, falando em parábolas, disse-lhes: «O reino dos Céus pode comparar-se a um rei que preparou um banquete nupcial para o seu filho. Mandou os servos chamar os convidados para as bodas, mas eles não quiseram vir. Mandou ainda outros servos, ordenando-lhes: ‘Dizei aos convidados: Preparei o meu banquete, os bois e os cevados foram abatidos, tudo está pronto. Vinde às bodas’. Mas eles, sem fazerem caso, foram um para o seu campo e outro para o seu negócio; os outros apoderaram-se dos servos, trataram-nos mal e mataram-nos. O rei ficou muito indignado e enviou os seus exércitos, que acabaram com aqueles assassinos e incendiaram a cidade. Disse então aos servos: ‘O banquete está pronto, mas os convidados não eram dignos. Ide às encruzilhadas dos caminhos e convidai para as bodas todos os que encontrardes’. Então os servos, saindo pelos caminhos, reuniram todos os que encontraram, maus e bons. E a sala do banquete encheu-se de convidados.


SENTADOS À MESA COM DEUS
Com certeza que todos nós já fomos convidados para um casamento. À medida que me vou aproximando dos trinta, os convites dos amigos que se casam vão chegando e nestas últimas férias, quando estive em Portugal, pude celebrar uns quantos e ficar para a boda de alguns. E que festas que foram! Deve ter dado muito trabalho para organizar (e algumas dores de cabeça), mas era realmente tudo do bom e do melhor! E o mais bonito foi ver a alegria sincera com que os convidados festejavam. Dançavam, cantavam, comiam... todos felizes por ver o amor que se transforma em vida real, em vida partilhada. O Evangelho deste Domingo compara o Reino de Deus com este tipo de alegria (e sabemos que ainda há-de ser melhor!).

Mas imaginem o que seria uma boda sem convidados. As mesas preparadas, o menú escolhido, a banda já paga (sem possibilidade de reembolso...) e à última hora, os noivos deparam-se com um salão vazio, porque os convidados não quiseram aparecer. Que tristeza!

Quais os motivos que podem levar uma pessoa a recusar o convite para uma festa destas?

Participar no grande banquete (aceitar o messianismo de Jesus) significa abandonar a imagem de um deus “milagreiro”, de um deus comerciante, a quem podemos comprar a salvação. Significa passar da superstição (renunciar a medalhinhas, “rezas” e promessas/negócios...) a uma verdadeira fé de conversão! É iniciar uma vida onde a oração não é uma récita estéril, mas um profundo diálogo com o Pai; onde a salvação não pode ser negociada, mas depende da gratuidade do amor divino, que nos convida a participar do seu banquete.

A nossa fé não é um conjunto de regras que devemos seguir. Não é uma moral ou uma filosofia de vida. Não é uma lista de mandamentos ou de preceitos religiosos. A nossa fé é uma pessoa: Jesus Cristo. E a salvação é um convite, feito a todas as nações, culturas e tradições. Uma convocação feita por um Pai que aceita respostas em qualquer língua deste mundo. Ele não exige que todos sigam a mesma fórmula mágica, mas sim deseja, que todos se sentem à mesa do Seu banquete.

Infelizmente, muitas pessoas ainda preferem uma visão supersticiosa de Deus em vez do verdadeiro rosto do Pai. Porquê? Porque é fácil.
Acender uma vela? Um minuto, 20 cêntimos e já está.
Visitar Lurdes, Fátima ou Jerusalém? Basta inscrever-se nalguma peregrinação.
É tudo tão fácil... mas não serve a nada (repito: a nada!) se depois não acolhermos o convite de Deus.



(tenham uma boa semana!)


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sábado, 4 de outubro de 2008

XXVII DOMINGO DO TEMPO COMUM (ano A)


Leitura do Livro de Isaías
(Is 5,1-7)
Vou cantar, em nome do meu amigo, um cântico de amor à sua vinha. O meu amigo possuía uma vinha numa fértil colina. Lavrou-a e limpou-a das pedras, plantou-a de cepas escolhidas. No meio dela ergueu uma torre e escavou um lagar. Esperava que viesse a dar uvas, Mas ela só produziu agraços. E agora, habitantes de Jerusalém, e vós, homens de Judá, sede juízes entre mim e a minha vinha: Que mais podia fazer à minha vinha que não tivesse feito? Quando eu esperava que viesse a dar uvas, porque é que apenas produziu agraços? Agora vos direi o que vou fazer à minha vinha: vou tirar-lhe a vedação e será devastada; vou demolir-lhe o muro e será espezinhada. Farei dela um terreno deserto: não voltará a ser podada nem cavada, e nela crescerão silvas e espinheiros; e hei-de mandar às nuvens que sobre ela não deixem cair chuva. A vinha do Senhor do Universo é a casa de Israel, e os homens de Judá são a plantação escolhida. Ele esperava rectidão e só há sangue derramado; esperava justiça e só há gritos de horror.



SALMO RESPONSORIAL – Salmo 79 (80)
Refrão: A vinha do Senhor é a casa de Israel.

Arrancastes uma videira do Egipto,
expulsastes as nações para a transplantar.
Estendia até ao mar as suas vergônteas
e até ao rio os seus rebentos.

Porque lhe destruístes a vedação,
de modo que a vindime quem quer que passe pelo caminho?
Devastou-a o javali da selva
e serviu de pasto aos animais do campo.

Deus dos Exércitos, vinde de novo,
olhai dos céus e vede, visitai esta vinha.
Protegei a cepa que a vossa mão direita plantou,
o rebento que fortalecestes para Vós.

Não mais nos apartaremos de Vós:
fazei-nos viver e invocaremos o vosso nome.
Senhor, Deus dos Exércitos, fazei-nos voltar,
iluminai o vosso rosto e seremos salvos.



Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos Filipenses
(Filip 4,6-9)
Irmãos: Não vos inquieteis com coisa alguma. Mas, em todas as circunstâncias, apresentai os vossos pedidos diante de Deus, com orações, súplicas e acções de graças. E a paz de Deus, que está acima de toda a inteligência, guardará os vossos corações e os vossos pensamentos em Cristo Jesus. Quanto ao resto, irmãos, tudo o que é verdadeiro e nobre, tudo o que é justo e puro, tudo o que é amável e de boa reputação, tudo o que é virtude e digno de louvor é o que deveis ter no pensamento. O que aprendestes, recebestes, ouvistes e vistes em mim é o que deveis praticar. E o Deus da paz estará convosco.



Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus
(Mt 21,33-43)
Naquele tempo, disse Jesus aos príncipes dos sacerdotes e aos anciãos do povo: «Ouvi outra parábola: Havia um proprietário que plantou uma vinha, cercou-a com uma sebe, cavou nela um lagar e levantou uma torre; depois, arrendou-a a uns vinhateiros e partiu para longe. Quando chegou a época das colheitas, mandou os seus servos aos vinhateiros para receber os frutos. Os vinhateiros, porém, lançando mão dos servos, espancaram um, mataram outro, e a outro apedrejaram-no. Tornou ele a mandar outros servos, em maior número que os primeiros. E eles trataram-nos do mesmo modo. Por fim, mandou-lhes o seu próprio filho, dizendo: ‘Respeitarão o meu filho’. Mas os vinhateiros, ao verem o filho, disseram entre si: ‘Este é o herdeiro; matemo-lo e ficaremos com a sua herança’. E, agarrando-o, lançaram-no fora da vinha e mataram-no. Quando vier o dono da vinha, que fará àqueles vinhateiros?». Eles responderam: «Mandará matar sem piedade esses malvados e arrendará a vinha a outros vinhateiros, que lhe entreguem os frutos a seu tempo». Disse-lhes Jesus: «Nunca lestes na Escritura: ‘A pedra que os construtores rejeitaram tornou-se a pedra angular; tudo isto veio do Senhor e é admirável aos nossos olhos’? Por isso vos digo: Ser-vos-á tirado o reino de Deus e dado a um povo que produza os seus frutos».



À ESPERA DE RESPOSTA...
Depois dos operários da última hora e dos dois filhos chamados ao trabalho, a liturgia deste Domingo propõe-nos (antecipando de muitos séculos as tradicionais trilogias “holiwoodianas”...) uma terceira parábola onde a vindima e a vinha são colocadas ao centro da atenção.

É-nos descrita um pouco da realidade socioeconómica da Galileia antiga, onde os terrenos de cultivo pertenciam a latifundiários que os arrendavam a camponeses indigentes em troca de uma parte dos produtos recolhidos. Em anos de baixa produção agrícola surgiam facilmente movimentos de revolta campesina. Também o referimento que encontramos na parábola ao assassinato do herdeiro é em linha com as leis daquela altura. Em caso de morte de um latifundiário sem descendência, era previsto que os seus terrenos passassem para as mãos dos primeiros a ocupá-los.

Com esta parábola, Jesus denuncia a conspiração que os príncipes dos sacerdotes e os anciãos do povo tecem para O assassinar e sintetiza o percurso da história da salvação. É a história de um amor em crise entre um Deus irremediavelmente apaixonado e uma esposa (uma humanidade...) oportunista e infiel. Ao fim de três anos de pregação, deparamo-nos com um Jesus Cristo cansado e desiludido que reflecte sobre o próximo passo a dar para conseguir abrir os olhos (e o coração) do seu povo. A humanidade não aceita o seu Criador e persegue insistentemente uma ilusão de auto-suficiência.

O grande pecado revelado nesta parábola não é a conspiração homicida, mas a transformação da religião numa espécie de propriedade privada, disponível somente para um grupo restrito de pessoas que acreditam possuir a salvação por motivos de casta ou etnia. Jesus Cristo revela um Deus que ama todos os homens e mulheres deste mundo e uma redenção acessível a todos aqueles dispostos a partilhar os frutos da vinha. A rejeição da Sua mensagem e o repúdio violento da Sua pessoa nascem precisamente da incapacidade de aceitar que a Salvação não é propriedade de ninguém: nem de um povo, nem de um movimento, nem de uma igreja.

Quais as medidas que Deus deve tomar? A resposta chega implacável e severa pela boca dos fariseus que, sem suspeitar, condenam as próprias acções: «é preciso matar sem piedade esses malvados!». Mas o amor do Pai pelos seus filhos não concede espaço a sentimentos de vingança. Preparará um último gesto, um último sinal que revelará ao mundo o Seu amor.

A missão de Cristo culmina na cruz e na dádiva da Sua vida por nós. Não servem (não existem!) outras palavras, gestos ou sinais. Ele deu tudo o que tinha e neste momento, aguarda com esperança a nossa resposta. Já sabes o que Lhe vais dizer?



(tenham uma boa semana!)



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sábado, 27 de setembro de 2008

XXVI DOMINGO DO TEMPO COMUM (ano A)

Leitura da Profecia de Ezequiel
(Ez 18,25-28)
Eis o que diz o Senhor: «Vós dizeis: ‘A maneira de proceder do Senhor não é justa’. Escutai, casa de Israel: Será a minha maneira de proceder que não é justa? Não será antes o vosso modo de proceder que é injusto? Quando o justo se afastar da justiça, praticar o mal o vier a morrer, morrerá por causa do mal cometido. Quando o pecador se afastar do mal que tiver realizado, praticar o direito e a justiça, salvará a sua vida. Se abris os seus olhos e renunciar às faltas que tiver cometido, há-de viver e não morrerá».


SALMO RESPONSORIAL – Salmo 24 (25)
Refrão: Lembrai-Vos, Senhor, da vossa misericórdia.

Mostrai-me, Senhor, os vossos caminhos,
ensinai-me as vossas veredas.
Guiai-me na vossa verdade e ensinai-me,
porque Vós sois Deus, meu Salvador:
em vós espero sempre.

Lembrai-Vos, Senhor, das vossas misericórdias
e das vossas graças que são eternas.
Não recordeis as minhas faltas
e os pecados da minha juventude.
Lembrai-Vos de mim segundo a vossa clemência,
por causa da vossa bondade, Senhor.

O Senhor é bom e recto,
ensina o caminho aos pecadores.
Orienta os humildes na justiça
e dá-lhes a conhecer os seus caminhos.


Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos Filipenses
(Filip 2,1-11)
Irmãos: Se há em Cristo alguma consolação, algum conforto na caridade, se existe alguma consolação nos dons do Espírito Santo, alguns sentimentos de ternura e misericórdia, então, completai a minha alegria, tendo entre vós os mesmos sentimentos e a mesma caridade, numa só alma e num só coração. Não façais nada por rivalidade nem por vanglória; mas, com humildade, considerai os outros superiores a vós mesmos, sem olhar cada um aos seus próprios interesses, mas aos interesses dos outros.Tende em vós os mesmos sentimentos que havia em Cristo Jesus. Ele, que era de condição divina, não Se valeu da sua igualdade com Deus, mas aniquilou-Se a Si próprio. Assumindo a condição de servo, tornou-Se semelhante aos homens. Aparecendo como homem, humilhou-Se ainda mais, obedecendo até à morte, e morte de cruz. Por isso, Deus O exaltou e Lhe deu um nome que está acima de todos os nomes, para que ao nome de Jesus todos se ajoelhem, no céu, na terra e nos abismos, e toda a língua proclame que Jesus Cristo é o Senhor, para glória de Deus Pai.


Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus
(Mt 21,28-32)
Naquele tempo, disse Jesus aos príncipes dos sacerdotes e aos anciãos do povo: «Que vos parece? Um homem tinha dois filhos. Foi ter com o primeiro e disse-lhe: ‘Filho, vai hoje trabalhar na vinha’. Mas ele respondeu-lhe: ‘Não quero’. Depois, porém, arrependeu-se e foi. O homem dirigiu-se ao segundo filho e falou-lhe do mesmo modo. Ele respondeu: ‘Eu vou, Senhor’. Mas de facto não foi. Qual dos dois fez a vontade ao pai?» Eles responderam-Lhe: «O primeiro». Jesus disse-lhes: «Em verdade vos digo: Os publicanos e as mulheres de má vida irão diante de vós para o reino de Deus. João Baptista veio até vós, ensinando-vos o caminho da justiça, e não acreditastes nele; mas os publicanos e as mulheres de má vida acreditaram. E vós, que bem o vistes, não vos arrependestes, acreditando nele».



«NÃO É UM DIZER: É UM FAZER. É UM FAZER QUE É DIZER»*
Os últimos dados estatísticos (2007) sobre a população mundial falam de 6.463.234.000 pessoas no mundo. Dentro deste número incrível, os baptizados na fé cristã são 1.999.563.838. Isso quer dizer que existem dois biliões de cristãos espalhados pelos quatro cantos da Terra. É sem dúvida um número impressionante, que porém gera inevitavelmente uma pergunta:
Onde é que eles andam?

Dois mil milhões! 33% da população mundial! Mas apesar destes números, ainda experimentamos a sensação de viver num planeta onde o Evangelho é relativamente desconhecido. Parece-me que anda por aí muita gente a dizer que “sim”, mas que depois não aparece na vinha para trabalhar. Por onde andam os homens e as mulheres que amam o próximo como a si mesmos? E os misericordiosos, os puros de coração ou os que trabalham para a paz? Onde estão as pessoas que perdoam 70 vezes 7?

Evidentemente as estatísticas não conseguem dar-nos o quadro exacto da difusão da fé cristã. Dentro deste número temos de colocar todas as pessoas que, apesar do baptismo, nunca tiveram a oportunidade de aprofundar a própria fé, e cujo conhecimento da Igreja e do Evangelho permanece a um nível superficial, mais ligado a tradições e outros factores culturais do que propriamente a um verdadeiro caminho de conversão. Mas deste problema falaremos numa outra ocasião. Este Domingo somos convidados a reflectir sobre aqueles cristãos que realmente ouviram a voz do Pai, conhecem o Evangelho, responderam ao chamamento, mas não transformaram o próprio “sim” em gestos concretos.

Não há nada mais perigoso do que a ilusão de viver uma vida cristã.
Um pecador pode sempre arrepender-se, mudar de vida, caminhar na direcção do amor do Pai. No entanto, uma pessoa que diz a si própria «estou bem!», nunca irá procurar mais nada. Quem acredita que não precisa de mudar está condenado à imobilidade, e a nossa fé é Caminho!

É difícil encontrar alguém que se considera um santo (ou que pelo menos o diga abertamente, porque um pouco de humildade fica sempre bem...). Mas é tão fácil encontrar pessoas que não se consideram pecadoras. «Sr. padre, eu nunca matei nem roubei ninguém». Ainda bem! Mas será que se pode viver uma vida inteira consolados com a ideia de não ser réus de crimes tão graves? Quando é que deixamos de nos comparar com os piores e começamos a trabalhar para seguir o exemplo daqueles que são mais generosos, mais honestos e mais justos do que nós?

A nossa vocação é a santidade. O nosso modelo é Jesus Cristo. Não basta dizer “sim”. É preciso unir à convicção das nossas palavras a força dos nossos gestos. É necessário trabalhar e não parar nunca de caminhar na direcção do amor de Deus Pai. E se todos nós o fizermos (dois biliões de pessoas!) então não somos só nós que mudamos, mas o mundo inteiro também se transforma.



(tenham uma boa semana!)

* poema de Octavio Paz, prémio nobel da literatura em 1990


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sábado, 20 de setembro de 2008

XXV DOMINGO DO TEMPO COMUM (ano A)


Leitura do Livro de Isaías
(Is 55,6-9)
Procurai o Senhor, enquanto se pode encontrar, invocai-O, enquanto está perto. Deixe o ímpio o seu caminho e o homem perverso os seus pensamentos. Converta-se ao Senhor, que terá compaixão dele, ao nosso Deus, que é generoso em perdoar. Porque os meus pensamentos não são os vossos, nem os vossos caminhos são os meus – oráculo do Senhor –. Tanto quanto o céu está acima da terra, assim os meus caminhos estão acima dos vossos e acima dos vossos estão os meus pensamentos.

SALMO RESPONSORIAL – Salmo 144 (145)
Refrão: O Senhor está perto de quantos O invocam.

Quero bendizer-Vos, dia após dia,
e louvar o vosso nome para sempre.
Grande é o Senhor e digno de todo o louvor,
insondável é a sua grandeza.

O Senhor é clemente e compassivo,
paciente e cheio de bondade.
O Senhor é bom para com todos
e a sua misericórdia se estende a todas as criaturas.

O Senhor é justo em todos os seus caminhos
e perfeito em todas as suas obras.
O Senhor está perto de quantos O invocam,
de quantos O invocam em verdade.

Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos Filipenses
(Filip 1,20c-24.27ª)
Irmãos: Cristo será glorificado no meu corpo, quer eu viva quer eu morra. Porque, para mim, viver é Cristo e morrer é lucro. Mas, se viver neste corpo mortal é útil para o meu trabalho, não sei o que escolher. Sinto-me constrangido por este dilema: desejaria partir e estar com Cristo, que seria muito melhor; mas é mais necessário para vós que eu permaneça neste corpo mortal. Procurai somente viver de maneira digna do Evangelho de Cristo.


Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus
(Mt 20,1-16ª)
Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos a seguinte parábola: «O reino dos Céus pode comparar-se a um proprietário, que saiu muito cedo a contratar trabalhadores para a sua vinha. Ajustou com eles um denário por dia e mandou-os para a sua vinha. Saiu a meio da manhã, viu outros que estavam na praça ociosos e disse-lhes: ‘Ide vós também para a minha vinha e dar-vos-ei o que for justo’. E eles foram. Voltou a sair, por volta do meio-dia e pelas três horas da tarde, e fez o mesmo. Saindo ao cair da tarde, encontrou ainda outros que estavam parados e disse-lhes: ‘Porque ficais aqui todo o dia sem trabalhar?’ Eles responderam-lhe: ‘Ninguém nos contratou’. Ele disse-lhes: ‘Ide vós também para a minha vinha’. Ao anoitecer, o dono da vinha disse ao capataz: ‘Chama os trabalhadores e paga-lhes o salário, a começar pelos últimos e a acabar nos primeiros’. Vieram os do entardecer e receberam um denário cada um. Quando vieram os primeiros, julgaram que iam receber mais, mas receberam também um denário cada um. Depois de o terem recebido, começaram a murmurar contra o proprietário, dizendo: ‘Estes últimos trabalharam só uma hora e deste-lhes a mesma paga que a nós, que suportámos o peso do dia e o calor’. Mas o proprietário respondeu a um deles: ‘Amigo, em nada te prejudico. Não foi um denário que ajustaste comigo? Leva o que é teu e segue o teu caminho. Eu quero dar a este último tanto como a ti. Não me será permitido fazer o que eu quero do que é meu? Ou serão maus os teus olhos porque eu sou bom?’ Assim, os últimos serão os primeiros e os primeiros serão os últimos».


COMPRAR A SALVAÇÃO
Sejamos sinceros: quantos de nós, ao escutarmos o evangelho deste Domingo, concordámos, pelo menos um bocadinho, com o mau humor dos primeiros trabalhadores? Provavelmente muitos. Trabalhar um dia inteiro ao Sol para receber um denário, e depois ver outros, que só trabalharam uma hora, receberem exactamente o mesmo...? Não é justo! Alguns dos trabalhadores até devem ter pensado: «se eu soubesse, tinha ficado quieto o dia inteiro e também só trabalhava a última hora».

Invejar quem chega à vinha na última hora significa que ainda não compreendemos a beleza da vindima. Um cristão não pode secretamente cobiçar uma vida sem fé e sem Deus. Isso é sinal de que ainda não conhece o verdadeiro rosto do Pai e vive a própria fé como um peso necessário para que o paraíso não lhe escape. Que coisa tão triste...
Quem acolheu (verdadeiramente!) no próprio coração o dom da fé, não pode não alegrar-se quando mais alguém descobre a beleza da vocação cristã.

Os trabalhadores sentiram-se enganados, mas basta ler de novo a parábola para ver que não é esse o caso. Ninguém lhes tirou nada, no entanto, foram incapazes de se alegrar com a generosidade do patrão. O problema é que ainda somos prisioneiros da ideia de um "deus contabilista", que vai anotando tudo aquilo que fazemos na nossa vida (coisas boas e más) e que no final faz as contas e dá a cada um o merecido, o devido, o justo. Mas Jesus mostra-nos que o seu Pai tem uma outra lógica.

O filho pródigo merecia ser acolhido de braços abertos?
A adúltera merecia ser defendida?
O amor de Deus é dom, é sempre gratuito. Não precisa de ser "comprado" com as nossas boas acções. A salvação que Ele nos oferece pode ser acolhida ou recusada, mas não precisamos de regatear com Jesus Cristo. Ele dá a sua vida por todos nós, bons e maus, amigos e inimigos. E o seu exemplo é caminho, verdade e vida.

Normalmente numa paróquia, para além das pessoas que discretamente trabalham com generosidade, encontramos também aquelas que não conseguem viver o próprio serviço com autêntica gratuidade: olham para os novos "trabalhadores" como se estes fossem concorrentes e reivindicam para si direitos e privilégios como se fossem "donos" da paróquia, «porque eu já cá estou há mais tempo do que eles» ou «porque eu tenho trabalhado mais para a paróquia do que todos os outros».

O bem que fazemos não deve ter segundos fins. Se ajudas uma pessoa, fá-lo pelo simples motivo de que ela precisa da tua ajuda. Talvez oiças um "obrigado". Talvez haja uma recompensa. Mas a tua motivação deve ser gratuita, livre e sincera, tal como o amor do Pai é gratuito, livre e sincero.



(tenham uma boa semana!)

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