sábado, 30 de outubro de 2010

XXXI DOMINGO DO TEMPO COMUM (ano C)



Leitura do Livro da Sabedoria
(Sab 11,22-12,2)
Diante de Vós, Senhor, o mundo inteiro é como um grão de areia na balança, como a gota de orvalho que de manhã cai sobre a terra. De todos Vós compadeceis, porque sois omnipotente, e não olhais para os seus pecados, para que se arrependam. Vós amais tudo o que existe e não odiais nada do que fizestes; porque, se odiásseis alguma coisa, não a teríeis criado. e como poderia subsistir, se Vós não a quisésseis? Como poderia durar, se não a tivésseis chamado à existência? Mas a todos perdoais, porque tudo é vosso, Senhor, que amais a vida. O vosso espírito incorruptível está em todas as coisas. Por isso castigais brandamente aqueles que caem e advertis os que pecam, recordando-lhes os seus pecados, para que se afastem do mal e acreditem em Vós, Senhor.


SALMO RESPONSORIAL – Salmo 144(145)
Refrão: Louvarei para sempre o vosso nome, Senhor meu Deus e meu Rei.

Quero exaltar-Vos meu Deus e meu Rei
e bendizer o vosso nome para sempre.
Quero bendizer-vos, dia após dia,
e louvar o vosso nome para sempre.

O Senhor é clemente e compassivo,
paciente e cheio de bondade.
O Senhor é bom para com todos
e a sua misericórdia se estende a todas as criaturas.

Graças Vos dêem, Senhor, todas as criaturas
e bendigam-Vos os vossos fiéis.
Proclamem a glória do vosso Reino
e anunciem os vossos feitos gloriosos.

O Senhor é fiel à sua palavra
e perfeito em todas as suas obras.
O Senhor ampara os que vacilam
e levanta todos os oprimidos.


Leitura da Segunda Epístola do apóstolo São Paulo aos Tessalonicenses
(2 Tes 1,11-2,2)
Irmãos: Oramos continuamente por vós, para que Deus vos considere dignos do seu chamamento e, pelo seu poder, se realizem todos os vosso bons propósitos e se confirme o trabalho da vossa fé. Assim o nome de Nosso Senhor Jesus Cristo será glorificado em vós, e vós n’Ele, segundo a graça do nosso Deus e do Senhor Jesus Cristo. Nós vos pedimos, irmãos, a propósito da vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo e do nosso encontro com Ele: Não vos deixeis abalar facilmente nem alarmar por qualquer manifestação profética, por palavras ou por cartas, que se digam vir de nós, pretendendo que o dia do Senhor está iminente.


Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
(Lc 19,1-10)
Naquele tempo, Jesus entrou em Jericó e começou a atravessar a cidade. Vivia ali um homem rico chamado Zaqueu, que era chefe de publicanos. Procurava ver quem era Jesus, mas, devido à multidão, não podia vê-l’O, porque era de pequena estatura. Então correu mais à frente e subiu a um sicómoro, para ver Jesus, que havia de passar por ali. Quando Jesus chegou ao local, olhou para cima e disse-lhe: «Zaqueu, desce depressa, que Eu hoje devo ficar em tua casa». Ele desceu rapidamente e recebeu Jesus com alegria. Ao verem isto, todos murmuravam, dizendo: «Foi hospedar-Se em casa dum pecador». Entretanto, Zaqueu apresentou-se ao Senhor, dizendo: «Senhor, vou dar aos pobres metade dos meus bens e, se causei qualquer prejuízo a alguém, restituirei quatro vezes mais». Disse-lhe Jesus: «Hoje entrou a salvação nesta casa, porque Zaqueu também é filho de Abraão. Com efeito, o Filho do homem veio procurar e salvar o que estava perdido».


SEM EXCEPÇÃO
Depois de algumas parábolas e ensinamentos “teóricos”, hoje Jesus demonstra-nos “na prática” uma das verdades mais bonitas, inesperadas e comoventes do Evangelho: Deus ama todos os seus filhos, sem excepção, e não exclui do Seu amor os marginalizados, os “impuros”, os pecadores públicos. Pelo contrário, é precisamente por eles (aqueles que a doutrina “oficial” colocou à margem da salvação) que Deus manifesta uma especial predilecção.

Porém, a meditação do Evangelho pede a inevitável incarnação do mesmo na nossa realidade. A mensagem de salvação permanece intacta, no entanto, é necessário actualizar o elenco dos excluídos e marginalizados: hoje, o famoso pedido de hospitalidade seria dirigido (provavelmente) a um homossexual, a um divorciado ou a uma abortista. E o murmurinho que esse gesto provocou nas multidões de então, provavelmente ouvir-se-ia novamente nas nossas comunidades. «Que escândalo! Foi alojar-se na casa daquela pessoa!»

A reacção de Zaqueu é muito importante para a nossa reflexão: ele não só acolhe Jesus com alegria, mas converte-se à lógica do Seu amor. Mas atenção: repare-se que Zaqueu só resolve ser generoso depois (!) do encontro com Jesus. Não foi após a conversão que o amor de Deus “visitou” o pecador mas, pelo contrário, foi essa visita (esse amor) que provocou a conversão e que converteu o egoísmo de Zaqueu em generosidade. Prova-se assim, que só a lógica do amor pode transformar este mundo e os corações dos homens.

Muitas vezes, em nome de Deus, marginalizamos e excluímos. Assumimos atitudes de censura, de crítica, de acusação que, longe de provocar a conversão do pecador, afastam-no ainda mais e levam-no a radicalizar as suas atitudes. Hoje o Evangelho de Jesus diz-nos que só o amor gera amor e que só com amor (não com intolerância ou fanatismo) conseguiremos transformar o mundo e o coração dos homens. Na verdade, como é que acolhemos e tratamos os que têm comportamentos socialmente inaceitáveis? Como é que acolhemos e integramos os que, pelas suas opções ou pelas voltas que a vida dá, assumem atitudes diferentes das que consideramos correctas, à luz dos ensinamentos da Igreja?

No entanto, testemunhar o Deus que ama (e que acolhe todos os homens) não significa branquear o pecado e pactuar com o que está errado. Tudo aquilo que é mau deve ser combatido. Contudo, distingamos (sempre!) entre pecador e pecado: Deus convida-nos a denunciar e a combater o pecado, mas não seríamos verdadeiros cristãos se não nos esforçássemos por amar e respeitar todos os homens e mulheres, inclusive os pecadores.


(Tenham uma boa semana!)


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sábado, 23 de outubro de 2010

XXX DOMINGO DO TEMPO COMUM (ano C)



Leitura do Livro de Ben-Sirá
(Sir 35,15b-17.20-22a)
O Senhor é um juiz que não faz acepção de pessoas. Não favorece ninguém em prejuízo do pobre e atende a prece do oprimido. Não despreza a súplica do órfão nem os gemidos da viúva. Quem adora a Deus será bem acolhido e a sua prece sobe até às nuvens. A oração do humilde atravessa as nuvens e não descansa enquanto não chega ao seu destino. Não desiste, até que o Altíssimo o atenda, para estabelecer o direito dos justos e fazer justiça.


SALMO RESPONSORIAL – Salmo 33 (34)
Refrão: O pobre clamou e o Senhor ouviu a sua voz.

A toda a hora bendirei o Senhor,
o seu louvor estará sempre na minha boca.
A minha alma gloria-se no Senhor:
escutem e alegrem-se os humildes.

A face do Senhor volta-se contra os que fazem o mal,
para apagar da terra a sua memória.
Os justos clamaram e o Senhor os ouviu,
livrou-os de todas as angústias.

O Senhor está perto dos que têm o coração atribulado
e salva os de ânimo abatido.
O Senhor defende a vida dos seus servos,
não serão castigados os que n’Ele confiam.


Leitura da Segunda Epístola do apóstolo São Paulo a Timóteo
(2 Tim 4,6-8.16-18)
Caríssimo: Eu já estou oferecido em libação e o tempo da minha partida está iminente. Combati o bom combate, terminei a minha carreira, guardei a fé. E agora já me está preparada a coroa da justiça, que o Senhor, justo juiz, me há-de dar naquele dia; e não só a mim, mas a todos aqueles que tiverem esperado com amor a sua vinda. Na minha primeira defesa, ninguém esteve a meu lado: todos me abandonaram. Queira Deus que esta falta não lhes seja imputada. O Senhor esteve a meu lado e deu-me força, para que, por meu intermédio, a mensagem do Evangelho fosse plenamente proclamada e todas as nações a ouvissem; e eu fui libertado da boca do leão. O Senhor me livrará de todo o mal e me dará a salvação no seu reino celeste. Glória a Ele pelos séculos dos séculos. Amen.


Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
(Lc 18,9-14)
Naquele tempo, Jesus disse a seguinte parábola para alguns que se consideravam justos e desprezavam os outros: «Dois homens subiram ao templo para orar; um era fariseu e o outro publicano. O fariseu, de pé, orava assim: ‘Meu Deus, dou-Vos graças por não ser como os outros homens, que são ladrões, injustos e adúlteros, nem como este publicano. Jejuo duas vezes por semana e pago o dízimo de todos os meus rendimentos’. O publicano ficou a distância e nem sequer se atrevia a erguer os olhos ao Céu; Mas batia no peito e dizia: ‘Meu Deus, tende compaixão de mim, que sou pecador’. Eu vos digo que este desceu justificado para sua casa e o outro não. Porque todo aquele que se exalta será humilhado e quem se humilha será exaltado».


SANTOS E PECADORES
Diante da parábola do fariseu e do publicano, normalmente a minha reflexão (e, certamente, a de muitos cristãos) seguiria esta linha: enquanto que no fariseu vemos todos aqueles que se acreditam irrepreensíveis e olham com arrogância e soberba os que os rodeiam, no publicano vemos a pessoa que reconhece os próprios erros e pede humildemente perdão a Deus. Jesus exalta a atitude do pecador arrependido e aprendemos que vaidade e hipocrisia são obstáculos que impedem o homem de experimentar a graça da misericórdia de Deus. Tenho a certeza de que hoje, em muitas igrejas, se escutarão homílias que seguem esta lógica, mas a leitura de um comentário, escrito pelo Frei Raniero Cantalamessa (pregador da Casa Pontifícia), levou-me a pôr em causa a validade desta explicação e a perguntar-me se não estaria já “fora do prazo” para os cristãos dos nossos tempos.

Não é que a interpretação clássica esteja errada, mas a nossa sociedade é totalmente diferente da de Jesus. Ele contava as suas parábolas a um mundo profundamente religioso, onde a hipocrisia consistia em ostentar a observância dos preceitos e uma imagem de santidade, pois estas eram as qualidades que suscitavam o aplauso das multidões. Na nossa sociedade secularizada e permissiva, os valores alteraram-se radicalmente. O que se admira hoje em dia é precisamente o contrário: o aplauso vai a quem contesta as normas tradicionais e o adjectivo “transgressivo” tornou-se um dos elogios mais desejados.

É precisamente esta nova ordem das coisas que nos obriga a alterar os termos da parábola, se queremos preservar o seu significado original. Os publicanos de ontem são os novos fariseus de hoje! Actualmente são os publicanos (os transgressores) que dizem «Obrigado Deus, porque não sou como aqueles crentes, fariseus, hipócritas e intolerantes, que passam a vida a rezar, mas no fundo são piores do que os outros!». O mundo transformou-se de uma tal forma, que muitos até se esforçam por parecer maus (!), pois temem que alguém os possa apelidar de «santos»!

Uma conclusão prática que podemos aplicar, quer à interpretação tradicional, quer à reflexão que vos propus, é a seguinte: ninguém é totalmente fariseu e ninguém é totalmente publicano. Somos todos um pouco santos e um pouco pecadores. A coisa pior seria comportar-se como o publicano na vida e como o fariseu no templo. Os publicanos eram pecadores públicos, que colocavam o dinheiro acima de tudo; os fariseus eram, pelo contrário, pessoas muito austeras, que tentavam seguir escrupulosamente os mandamentos da Lei. O caminho que devemos absolutamente evitar é precisamente o de ser pecadores (publicanos no dia-a-dia) que pensam ser “justos” (fariseus no templo).

Se inevitavelmente devemos conciliar estas duas dimensões na nossa vida, pelo menos que seja ao contrário: fariseus no dia-a-dia e publicanos no templo. Como o fariseu, esforcemo-nos por não roubar, não enganar, respeitar as leis e pagar os impostos. Como o publicano, reconheçamos, quando estamos diante de Deus, que o que fizemos é sempre pouco e que necessitamos da Sua ajuda e misericórdia.


(Tenham uma boa semana!)



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sábado, 16 de outubro de 2010

XXIX DOMINGO DO TEMPO COMUM (ano C)



Leitura do Livro do Êxodo
(Ex 17,8-13a)
Naqueles dias, Amalec veio a Refidim atacar Israel. Moisés disse a Josué: «Escolhe alguns homens e amanhã sai a combater Amalec. Eu irei colocar-me no cimo da colina, com a vara de Deus na mão». Josué fez o que Moisés lhe ordenara e atacou Amalec, enquanto Moisés, Aarão e Hur subiram ao cimo da colina. Quando Moisés tinha as mãos levantadas, Israel ganhava vantagem; mas quando as deixava cair, tinha vantagem Amalec. Como as mãos de Moisés se iam tornando pesadas, trouxeram uma pedra e colocaram-no por debaixo para que ele se sentasse, enquanto Aarão e Hur, um de cada lado, lhe seguravam as mãos. Assim se mantiveram firmes as suas mãos até ao pôr do sol e Josué desbaratou Amalec e o seu povo ao fio da espada.


SALMO RESPONSORIAL – Salmo 120 (121)
Refrão: O nosso auxílio vem do Senhor, que fez o céu e a terra.

Levanto os meus olhos para os montes:
donde me virá o auxílio?
O meu auxílio vem do Senhor,
que fez o céu e a terra.

Não permitirá que vacilem os teus passos,
não dormirá Aquele que te guarda.
Não há-de dormir nem adormecer
aquele que guarda Israel.

O Senhor é quem te guarda,
o Senhor está a teu lado, Ele é o teu abrigo.
O sol não te fará mal durante o dia,
nem a luz durante a noite.

O Senhor te defende de todo o mal,
o Senhor vela pela tua vida.
Ele te protege quando vais e quando vens,
agora e para sempre.


Leitura da Segunda Epístola do apóstolo São Paulo a Timóteo
(2 Tim 3,14-4,2)
Caríssimo: Permanece firme no que aprendeste e aceitaste como certo, sabendo de quem o aprendeste. Desde a infância conheces as Sagradas Escrituras; elas podem dar-te a sabedoria que leva à salvação, pela fé em Cristo Jesus. Toda a Escritura, inspirada por Deus, é útil para ensinar, persuadir, corrigir e formar segundo a justiça. Assim o homem de Deus será perfeito, bem preparado para todas as boas obras. Conjuro-te diante de Deus e de Jesus Cristo, que há-de julgar os vivos e os mortos, pela sua manifestação e pelo seu reino: Proclama a palavra, insiste a propósito e fora de propósito, argumenta, ameaça e exorta, com toda a paciência e doutrina.


Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
(Lc 18,1-8)
Naquele tempo, Jesus disse aos seus discípulos uma parábola sobre a necessidade de orar sempre sem desanimar: «Em certa cidade vivia um juiz que não temia a Deus nem respeitava os homens. Havia naquela cidade uma viúva que vinha ter com ele e lhe dizia: ‘Faz-me justiça contra o meu adversário’. Durante muito tempo ele não quis atendê-la. Mas depois disse consigo: ‘É certo que eu não temo a Deus nem respeito os homens; mas, porque esta viúva me importuna, vou fazer-lhe justiça, para que não venha incomodar-me indefinidamente’». E o Senhor acrescentou: «Escutai o que diz o juiz iníquo!... E Deus não havia de fazer justiça aos seus eleitos, que por Ele clamam dia e noite, e iria fazê-los esperar muito tempo? Eu vos digo que lhes fará justiça bem depressa. Mas quando voltar o Filho do homem, encontrará fé sobre esta terra?»


REZAR PARA QUÊ?
O “coração” da parábola deste domingo não é a viúva obstinada e nem sequer o juiz que finalmente decide atender o pedido de justiça daquela mulher. A mensagem de que nos fala o Evangelho é a importância de rezar sempre. Jesus ensina-nos o valor da oração perseverante, constante e cheia de confiança. Se até mesmo um juiz iníquo, acabará por escutar uma viúva teimosa e insistente, quanto mais Deus (o Pai misericordioso!) escutará os que O procuram incansavelmente.

Mas rezar para quê, se acreditamos que o «Pai celeste sabe tudo o que necessitamos antes mesmo que o peçamos» (cf. Mt 6,5)? Rezar, porque é nesse diálogo que crescemos na compreensão dos projectos e ritmos de Deus. É nesse diálogo que Deus transforma os nossos corações. É nesse diálogo que aprendemos a entregarmo-nos nas mãos de Deus e a confiar n’Ele. A oração não é uma fórmula mágica e automática para levar Deus a fazer-nos as “vontadinhas”… É um exercício, um instrumento, um Caminho que percorremos para crescer na comunhão profunda com Ele.

O significado da frase de Jesus «pedi, e ser-vos-á dado; procurai, e encontrareis; batei, e hão-de abrir-vos» (Mt 7,7) pode ser compreendido somente após uma longa experiência de oração fiel e perseverante. O fruto dessa oração é a intimidade com o Pai. Intimidade (comunhão) que nos torna conscientes de que a porta que se abre, pode não ser aquela a que inicialmente batíamos, mas corresponde (sempre) à que realmente necessitamos. E é por isso que nós cristãos rezamos com confiança: «faça-se a Tua vontade, assim na terra como no céu».

(Tenham uma boa semana!)


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sábado, 9 de outubro de 2010

XXVIII DOMINGO DO TEMPO COMUM (ano C)



Leitura do Segundo Livro dos Reis
(2 Reis 5,14-17)
Naqueles dias, o general sírio Naamã desceu ao Jordão e aí mergulhou sete vezes, como lhe mandara Eliseu, o homem de Deus. A sua carne tornou-se tenra como a de uma criança e ficou purificado da lepra. Naamã foi ter novamente com o homem de Deus, acompanhado de toda a sua comitiva. Ao chegar diante dele, exclamou: «Agora reconheço que em toda a terra não há outro Deus senão o de Israel. Peço-te que aceites um presente deste teu servo». Eliseu respondeu-lhe: «Pela vida do Senhor que eu sirvo, nada aceitarei». E apesar das insistências, ele recusou. Disse então Naamã: «Se não aceitas, permite ao menos que se dê a este teu servo uma porção de terra para um altar, tanto quanto possa carregar uma parelha de mulas, porque o teu servo nunca mais há-de oferecer holocausto ou sacrifício a quaisquer outros deuses, mas apenas ao Senhor, Deus de Israel».


SALMO RESPONSORIAL – Salmo 97 (98)
Refrão : O Senhor manifestou a salvação a todos os povos.

Cantai ao Senhor um cântico novo
pelas maravilhas que Ele operou.
A sua mão e o seu santo braço
Lhe deram a vitória.

O Senhor deu a conhecer a salvação,
revelou aos olhos das nações a sua justiça.
Recordou-Se da sua bondade e fidelidade
em favor da casa de Israel.

Os confins da terra puderam ver
a salvação do nosso Deus.
Aclamai o Senhor, terra inteira,
exultai de alegria e cantai.


Leitura da Segunda Epístola do apóstolo São Paulo a Timóteo
(2 Tim 2,8-13)
Caríssimo: Lembra-te de que Jesus Cristo, descendente de David, ressuscitou dos mortos, segundo o meu Evangelho, pelo qual eu sofro, até ao ponto de estar preso a estas cadeias como um malfeitor. Mas a palavra de Deus não está encadeada. Por isso, tudo suporto por causa dos eleitos, para que obtenham a salvação que está em Cristo Jesus, com a glória eterna. É digna de fé esta palavra: Se morremos com Cristo, também com Ele viveremos; se sofremos com Cristo, também com ele reinaremos; se O negarmos, também Ele nos negará; se Lhe formos infiéis, Ele permanece fiel, porque não pode negar-Se a Si mesmo.


Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
(Lc 17,11-19)
Naquele tempo, indo Jesus a caminho de Jerusalém, passava entre a Samaria e a Galileia. Ao entrar numa povoação, vieram ao seu encontro dez leprosos. Conservando-se a distância, disseram em alta voz: «Jesus, Mestre, tem compaixão de nós». Ao vê-los, Jesus disse-lhes: «Ide mostrar-vos aos sacerdotes». E sucedeu que no caminho ficaram limpos da lepra. Um deles, ao ver-se curado, voltou atrás, glorificando a Deus em alta voz, e prostrou-se de rosto por terra aos pés de Jesus para Lhe agradecer. Era um samaritano. Jesus, tomando a palavra, disse: «Não foram dez que ficaram curados? Onde estão os outros nove? Não se encontrou quem voltasse para dar glória a Deus senão este estrangeiro?» E disse ao homem: «Levanta-te e segue o teu caminho; a tua fé te salvou».


SÃOS E SALVOS
Para compreendermos o episódio que o Evangelho nos propõe, é bom termos, pelo menos, uma ideia geral de como eram vistos, há dois mil anos atrás, os doentes de lepra e os samaritanos.

O leproso, no tempo de Jesus, era o protótipo do marginalizado: além de causar naturalmente repugnância pela sua aparência e de infundir o medo de contágio, ao leproso eram atribuídos, automaticamente, pecados graves (a lepra era vista como o castigo de Deus para esses pecados). Um leproso, quando identificado, era imediatamente excluído da sociedade e obrigado a afastar-se de qualquer convívio humano para não contaminar os outros com a sua impureza. Em caso de cura, devia apresentar-se diante de um sacerdote e, somente após a atestação dessa cura por parte da autoridade religiosa, podia então ser reintegrado na comunidade.

Para os judeus, também os samaritanos eram pessoas a evitar. A desconfiança religiosa dos judeus em relação aos samaritanos começou quando, em 721 a.C., os colonos assírios invadiram a Samaria e misturaram-se com a população local. Para os judeus, os habitantes da Samaria começaram então a “paganizar-se”, absorvendo vários elementos religiosos da cultura assírica. Os habitantes de Jerusalém desprezavam os samaritanos por causa deste sincretismo religioso e também, por causa do inevitável mestiçamento racial.

O episódio de hoje não é a única ocasião em que o Evangelho dá protagonismo a leprosos, samaritanos e outros “excluídos” da sociedade hebraica, reforçando desta forma a certeza de que a salvação oferecida por Deus, em Jesus, não se destina apenas à comunidade do “Povo eleito”, mas a todos os homens, sem excepção. No entanto, a “parábola viva” dos dez leprosos propõe-nos também uma outra reflexão muito importante: mais do que na cura em si, o acento do episódio de hoje é colocado na gratidão e no facto de apenas um dos leprosos curados ter voltado atrás para agradecer e «glorificar Deus».

A que serve estar “são” se não estou “salvo”? Dez pessoas foram curadas, mas apenas uma encontrou a salvação. E os nove ingratos representam perfeitamente uma ideia de cristianismo muito difusa, que vê em Deus um potente curandeiro, a invocar nos momentos de aflição, mas imediatamente colocado de parte quando as coisas correm bem. Jesus diz-nos que não há verdadeira redenção sem uma resposta de gratidão e de adesão plena à proposta de salvação que Deus faz.

Mas atenção: muitas vezes são aqueles que parecem mais fora da órbita de Deus que primeiro reconhecem o Seu dom, que o acolhem e que aderem à proposta de vida nova que lhes é feita. Às vezes, aqueles que lidam diariamente com o mundo do sagrado estão demasiado cheios de auto-suficiência e de orgulho para acolherem com humildade e simplicidade os dons de Deus, para manifestarem gratidão e para aceitarem ser transformados pela Sua graça. Respondamos com sinceridade: qual a atitude que, dia a dia, assumimos diante de Deus? É uma atitude de auto-suficiência, ou é uma atitude de adesão humilde e de gratidão?


(Boa semana e boa reflexão!)



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sábado, 2 de outubro de 2010

XXVII DOMINGO DO TEMPO COMUM (ano C)



Leitura da Profecia de Habacuc
(Hab 1,2-3; 2,2-4)
«Até quando, Senhor, chamarei por Vós e não Me ouvis? Até quando clamarei contra a violência e não me enviais a salvação? Porque me deixais ver a iniquidade e contemplar a injustiça? Diante de mim está a opressão e a violência, levantam-se contendas e reina a discórdia?» O Senhor respondeu-me: «Põe por escrito esta visão e grava-as em tábuas com toda a clareza, de modo que a possam ler facilmente. Embora esta visão só se realize na devida altura, ela há-de cumprir-se com certeza e não falhará. Se parece demorar, deves esperá-la, porque ela há-de vir e não tardará. Vede como sucumbe aquele que não tem alma recta; mas o justo viverá pela sua fidelidade».


SALMO RESPONSORIAL – Salmo 94 (95)
Refrão: Se hoje ouvirdes a voz do Senhor, não fecheis os vossos corações.

Vinde, exultemos de alegria no Senhor,
aclamemos a Deus, nosso Salvador.
Vamos à sua presença e dêmos graças,
ao som de cânticos aclamemos o Senhor.

Vinde, prostremo-nos em terra,
adoremos o Senhor que nos criou.
O Senhor é o nosso Deus
e nós o seu povo, as ovelhas do seu rebanho.

Quem dera ouvísseis hoje a sua voz:
«Não endureçais os vossos corações,
como em Meriba, como no dia de Massa no deserto,
onde vossos pais Me tentaram e provocaram,
apesar de terem visto as minhas obras».


Leitura da Segunda Epístola do apóstolo São Paulo a Timóteo
(2 Tim 1,6-8.13-14)
Caríssimo: Exorto-te a que reanimes o dom de Deus que recebeste pela imposição das minhas mãos. Deus não nos deu um espírito de timidez, mas de fortaleza, de caridade e moderação. Não te envergonhes de dar testemunho de Nosso Senhor, nem te envergonhes de mim, seu prisioneiro. Mas sofre comigo pelo Evangelho, confiando no poder de Deus. Toma como norma as sãs palavras que me ouviste, segundo a fé e a caridade que temos em Jesus Cristo. Guarda a boa doutrina que nos foi confiada, com o auxílio do Espírito Santo, que habita em nós.


Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
(Lc 17,5-10)
Naquele tempo, os Apóstolos disseram ao Senhor: «Aumenta a nossa fé». O Senhor respondeu: «Se tivésseis fé como um grão de mostarda, diríeis a esta amoreira: ‘Arranca-te daí e vai plantar-te no mar’, e ela obedecer-vos-ia. Quem de vós, tendo um servo a lavrar ou a guardar gado, lhe dirá quando ele volta do campo: ‘Vem depressa sentar-te à mesa’? Não lhe dirá antes: ‘Prepara-me o jantar e cinge-te para me servires, até que eu tenha comido e bebido. Depois comerás e beberás tu. Terá de agradecer ao servo por lhe ter feito o que mandou? Assim também vós, quando tiverdes feito tudo o que vos foi ordenado, dizei: ‘Somos inúteis servos: fizemos o que devíamos fazer’».


INÚTEIS?
Nas últimas seis semanas o Evangelho sublinhou várias vezes as exigências do caminho que devemos percorrer para alcançar o “Reino”. Jesus falou-nos da necessidade de liberdade em relação aos bens materiais (XXVI e XXV domingo); da exigência de testemunhar, sempre, a misericórdia e o perdão, (XXIV domingo); do dever de renunciar a tudo o que possa ser obstáculo à missão (XXIII domingo); da importância de converter o nosso coração à humildade (XXII domingo). Ficámos também a saber que a «porta é estreita» (XXI domingo) e tudo isto acabou por suscitar nos Apóstolos (e em nós também) o pedido, muito concreto, que “abre” o Evangelho deste domingo: «Senhor, aumenta a nossa fé!».

No Novo Testamento, em geral, a fé não corresponde a uma adesão a dogmas ou a um conjunto de verdades abstractas sobre Deus: neste caso corresponde à adesão a Cristo e ao projecto do “Reino”. Pedir a Jesus que aumente a fé significa, portanto, pedir-Lhe que aumente a coragem de optar pelo “Reino” e pelas exigências que o “Reino” comporta.

Imediatamente após este trecho, para evitar que caiamos numa visão “contratual” da fé, Lucas propõe-nos a parábola do servo inútil, onde é descrita a atitude que o homem deve assumir diante de Deus. Os fariseus estavam convencidos de que bastava cumprir os mandamentos para alcançar a salvação: se o homem cumprisse as regras, Deus não teria outro remédio senão salvá-lo. A salvação dependia, de acordo com esta perspectiva, dos méritos do homem. Deus seria, assim, apenas um contabilista, empenhado em fazer contas para ver se o homem tinha ou não direito à salvação…

Com a parábola do servo inútil, Jesus coloca as coisas numa dimensão diferente. A atitude do verdadeiro discípulo frente a Deus não deve ser a atitude de quem sente que fez tudo muito bem feito e que, por isso, Deus lhe deve algo, mas deve ser a atitude de quem cumpre o seu papel com humildade, sentindo-se um servo que apenas fez o que lhe competia. “Inúteis”, não porque sejamos incapazes, mas porque a salvação não depende dos nossos esforços: depende apenas da bondade do Pai.


(Tenham uma boa semana!)




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