sábado, 26 de junho de 2010

XIII DOMINGO DO TEMPO COMUM (ano C)



Leitura do Primeiro Livro dos Reis
(1 Re 19,16b.19-21)
Naqueles dias, disse o Senhor a Elias: «Ungirás Eliseu, filho de Safat, de Abel-Meola, como profeta em teu lugar». Elias pôs-se a caminho e encontrou Eliseu, filho de Safat, que andava a lavrar com doze juntas de bois e guiava a décima segunda. Elias passou junto dele e lançou sobre ele a sua capa. Então Eliseu abandonou os bois, correu atrás de Elias e disse-lhe: «Deixa-me ir abraçar meu pai e minha mãe; depois irei contigo». Elias respondeu: «Vai e volta, porque eu já fiz o que devia». Eliseu afastou-se, tomou uma junta de bois e matou-a; com a madeira do arado assou a carne, que deu a comer à sua gente. Depois levantou-se e seguiu Elias, ficando ao seu serviço.


SALMO RESPONSORIAL – Salmo 15 (16)
Refrão: O Senhor é a minha herança.

Defendei-me, Senhor: Vós sois o meu refúgio.
Diga ao Senhor: «Vós sois o meu Deus».
Senhor, porção da minha herança e do meu cálice,
está nas vossas mãos o meu destino.

Bendigo o Senhor por me ter aconselhado,
até de noite me inspira interiormente.
O Senhor está sempre na minha presença,
com Ele a meu lado não vacilarei.

Por isso o meu coração se alegra e a minha alma exulta
e até o meu corpo descansa tranquilo.
Vós não abandonareis a minha alma na mansão dos mortos,
nem deixareis o vosso fiel sofrer a corrupção.

Dar-me-eis a conhecer os caminhos da vida,
alegria plena na vossa presença,
delícias eternas à vossa direita.


Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos Gálatas
(Gal 5,1.13-18)
Irmãos: Foi para a verdadeira liberdade que Cristo nos libertou. Portanto, permanecei firmes e não torneis a sujeitar-vos ao jugo da escravidão. Vós, irmãos, fostes chamados à liberdade. Contudo, não abuseis da liberdade como pretexto para viverdes segundo a carne; mas, pela caridade, colocai-vos ao serviço uns dos outros, porque toda a Lei se resume nesta palavra: «Amarás o teu próximo como a ti mesmo». Se vós, porém, vos mordeis e devorais mutuamente, tende cuidado, que acabareis por destruir-vos uns aos outros. Por isso vos digo: Deixai-vos conduzir pelo Espírito e não satisfareis os desejos da carne. Na verdade, a carne tem desejos contrários aos do Espírito, e o Espírito desejos contrários aos da carne. São dois princípios antagónicos e por isso não fazeis o que quereis. Mas se vos deixais guiar pelo Espírito, não estais sujeitos à Lei de Moisés.


Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
(Lc 9,51-62)
Aproximando-se os dias de Jesus ser levado deste mundo, Ele tomou a decisão de Se dirigir a Jerusalém e mandou mensageiros à sua frente. Estes puseram-se a caminho e entraram numa povoação de samaritanos, a fim de Lhe prepararem hospedagem. Mas aquela gente não O quis receber, porque ia a caminho de Jerusalém. Vendo isto, os discípulos Tiago e João disseram a Jesus: «Senhor, queres que mandemos descer fogo do céu que os destrua?» Mas Jesus voltou-Se e repreendeu-os. E seguiram para outra povoação. Pelo caminho, alguém disse a Jesus: «Seguir-Te-ei para onde quer que fores». Jesus respondeu-lhe: «As raposas têm as suas tocas e as aves do céu os seus ninhos; mas o Filho do homem não tem onde reclinar a cabeça». Depois disse a outro: «Segue-Me». Ele respondeu: «Senhor, deixa-me ir primeiro sepultar meu pai». Disse-lhe Jesus: «Deixa que os mortos sepultem os seus mortos; tu, vai anunciar o reino de Deus». Disse-Lhe ainda outro: «Seguir-Te-ei, Senhor; mas deixa-me ir primeiro despedir-me da minha família». Jesus respondeu-lhe: «Quem tiver lançado as mãos ao arado e olhar para trás não serve para o reino de Deus».


DISCÍPULOS
Se no domingo passado éramos convidados a responder à pergunta «quem é Jesus, para mim?», esta semana a perspectiva muda completamente e o Evangelho convida-nos a meditar a seguinte questão: «para Jesus, quem é o verdadeiro discípulo?». Lucas apresenta, através do diálogo com três “candidatos”, algumas das condições para entrar no discipulado de Jesus e percorrer com Ele, esse caminho que leva a Jerusalém, isto é, que leva à plenitude da salvação. Que condições são essas?

Com o primeiro diálogo aprendemos que o discípulo deve despojar-se totalmente das preocupações materiais: para ele, o Reino tem de ser infinitamente mais importante do que as comodidades e o bem-estar material. O segundo diálogo ensina que, todos os deveres e obrigações deste mundo, mesmo os mais importantes, são secundários quando comparados com o compromisso de seguir Jesus Cristo. O terceiro diálogo sugere-nos que o discípulo deve despegar-se de tudo (até da própria família, se for necessário), para fazer do Reino a sua prioridade fundamental: nada deve adiar ou demorar a nossa resposta.

É uma página do Evangelho que surpreende e choca pelo radicalismo e nível de compromisso que exige. Confirmamos que Jesus não é um “guru” sedento de adeptos, disposto a atenuar as condições do discipulado ou a abaixar o ideal de vida proposto, para obter o aplauso das multidões e aumentar o número dos fiéis da sua Igreja. O Caminho pede sacrifícios, abnegação, fidelidade. Porém, as exigências que encontramos nestes diálogos, não devem ser lidas como normas da fé cristã: sabemos que noutras circunstâncias, Jesus Cristo mandou cuidar dos pais (cf. Mt 15,3-9) e os discípulos fizeram-se acompanhar das esposas durante as viagens missionárias (cf. 1 Cor 9,5).

Na óptica do Reino de Deus, as relações pessoais não perdem a própria importância, mas convertem-se completamente à lógica do Evangelho. Jesus subordina os vínculos familiares à adesão ao Reino, não para minimizar estes laços fundamentais, mas sim, para realçar a nova mentalidade que deverá animar cada cristão. Utilizando estes três diálogos (polémicos e provocadores!), o evangelista Lucas encoraja os discípulos a eliminar da própria vida tudo aquilo que possa ser um obstáculo no testemunho quotidiano do Reino. Porém, paradoxalmente, nenhum testemunho é eficaz se não se traduz em relações concretas de amor e solidariedade. Tal como escreveu S. João apóstolo: «Se alguém disser: “Eu amo a Deus”, mas tiver ódio ao seu irmão, esse é um mentiroso; pois aquele que não ama o seu irmão, a quem vê, não pode amar a Deus, a quem não vê. E nós recebemos dele este mandamento: quem ama a Deus, ame também o seu irmão (1Jo 4,20-21)».


(Tenham uma boa semana!)


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sexta-feira, 18 de junho de 2010

XII DOMINGO DO TEMPO COMUM (ano C)



Leitura da Profecia de Zacarias
(Zac 12,10-11;13,1)
Eis o que diz o Senhor: «Sobre a casa de David e os habitantes de Jerusalém derramarei um espírito de piedade e de súplica. Ao olhar para Mim, a quem trespassaram, lamentar-se-ão como se lamenta um filho único, chorarão como se chora o primogénito. Naquele dia, haverá grande pranto em Jerusalém, como houve em Hadad-Rimon, na planície de Megido. Naquele dia, jorrará uma nascente para a casa de David e para os habitantes de Jarusalém, a fim de lavar o pecado e a impureza.


SALMO RESPONSORIAL – Salmo 62 (63)
Refrão: A minha alma tem sede de Vós, meu Deus.

Senhor, sois o meu Deus: desde a autora Vos procuro.
A minha alma tem sede de Vós.
Por Vós suspiro,
como terra árida, sequiosa, sem água.

Quero contemplar-Vos no santuário,
para ver o vosso poder e a vossa glória.
A vossa graça vale mais que a vida:
por isso os meus lábios hão-de cantar-Vos louvores.

Assim Vos bendirei toda a minha vida
e em vosso louvor levantarei as mãos.
Serei saciado com saborosos manjares
e com vozes de júbilo Vos louvarei.

Porque Vos tornastes o meu refúgio,
exulto à sombra das vossas asas.
Unido a Vós estou, Senhor,
a vossa mão me serve de amparo.


Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos Gálatas
(Gal 3,26-29)
Irmãos: Todos vós sois filhos de Deus pela fé em Jesus Cristo, porque todos vós, que fostes baptizados em Cristo, fostes revestidos de Cristo. Não há judeu nem grego, não há escravo nem livre, não há homem nem mulher; todos vós sois um só em Cristo Jesus. Mas, se pertenceis a Cristo, sois então descendência de Abraão, herdeiros segundo a promessa.


Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
Um dia, Jesus orava sozinho, estando com Ele apenas os discípulos. Então perguntou-lhes: «Quem dizem as multidões que Eu sou?» Eles responderam: «Uns, João Baptista; outros, que és Elias; e outros, que és um dos antigos profetas que ressuscitou». Disse-lhes Jesus: «E vós, quem dizeis que Eu sou?» Pedro tomou a palavra e respondeu: «És o Messias de Deus». Ele, porém, proibiu-lhes severamente de o dizerem fosse a quem fosse e acrescentou: «O Filho do homem tem de sofrer muito, ser rejeitado pelos anciãos, pelos príncipes dos sacerdotes e pelos escribas; tem de ser morto e ressuscitar ao terceiro dia». Depois, dirigindo-Se a todos, disse: «Se alguém quiser vir comigo, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz todos os dias e siga-Me. Pois quem quiser salvar a sua vida, há-de perdê-la; mas quem perder a sua vida por minha causa, salvá-la-á».


MISSA DE 7º DIA
Lembro-me de uma vez ter enviado uma carta aqui de Itália e, por estar cheio de pressa, apenas ter escrito no envelope três coisas: «sr. Prior, Peniche, Portugal». “P...”, “p...”, “p...” e a carta chegou ao seu destino. O carteiro não necessitou de outros elementos, pois durante mais de sessenta anos, aqueles três indícios podiam indicar apenas uma pessoa: monsenhor Manuel Bastos, pároco de Peniche desde 1947.

O comentário de hoje vai ser um pouco diferente, pois na semana passada, este santo sacerdote partiu para a Casa do Pai. Neste sábado, em que celebramos a missa de 7º dia, queria partilhar algumas recordações e outras coisas que durante estes dias andaram na minha cabeça e no meu coração.

A morte do “sr. Prior” não foi uma surpresa. Mas apesar de anunciada e esperada, a notícia do seu falecimento foi dura de ouvir e deixou muitos penicheiros com uma estranha sensação de orfandade. Órfãos, porque embora faltasse o laço de sangue, outros laços bem fortes se tinham criado em seis décadas de serviço incansável e doação paterna à comunidade de Peniche.

Como era de esperar, à medida que a notícia da sua morte se divulgava, algumas pessoas tentaram elaborar pequenas biografias que enumerassem os encargos e obras mais salientes que caracterizaram os 62 anos de vida sacerdotal de monsenhor Bastos. Uma empresa difícil, pois nenhum rol de datas e feitos poderá fazer justiça e realmente descrever o que foi o empenho a 360º deste pároco, que influenciou de uma forma tão singular o caminho religioso, social, cultural e (até) desportivo de três gerações de penicheiros.

E por falar em penicheiros, queria oferecer àqueles que seguem este blog uma foto (e muitos já ma pediram!). Foi tirada o ano passado, depois da missa na igreja da Ajuda que encerrou a Festa de Nossa Senhora da Boa Viagem, quando numa ocasião única, se conseguiram juntar para almoçar, todos os padres da nossa terra: o antigo prior, o novo prior e os cinco padres que Peniche deu à Igreja. Para mim é uma foto muito especial, não só porque me traz à memória um momento feliz, mas também, porque me recorda o quanto pode ser “fecunda” a vida de um sacerdote. Uma riqueza que, no caso do padre Bastos, se vê não apenas nos rapazes da paróquia que decidiram entrar no seminário, mas também em todos os leigos (homens e mulheres, casais, jovens, crianças e idosos) que se deixaram contagiar pelo seu testemunho corajoso de fé. E foram muitos. Somos muitos.

Durante os seus longos, longos anos de vida sacerdotal, o nosso querido sr. Prior deve ter meditado muitas vezes a página do Evangelho de Lucas que encontramos na liturgia deste domingo. Muitas vezes ele deve ter lido estas palavras que Jesus diz aos seus discípulos: «Se alguém quiser vir comigo, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz todos os dias e siga-Me. Pois quem quiser salvar a sua vida, há-de perdê-la; mas quem perder a sua vida por minha causa, salvá-la-á».

Ele leu e confiou. E o Senhor não o desiludiu.

Vele por nós sr. Prior e até um dia, quando nos encontrarmos na Casa do Pai.


(Para verem a foto, basta clicar AQUI)


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sábado, 12 de junho de 2010

XI DOMINGO DO TEMPO COMUM (ano C)



Leitura do Segundo Livro de Samuel
(2 Sm 12,7-10.13)
Naqueles dias, disse Natã a David: «Assim fala o Senhor, Deus de Israel: Ungi-te como rei de Israel e livrei-te das mãos de Saul. Entreguei-te a casa do teu senhor e pus-te nos braços as suas mulheres. Dei-te a casa de Israel e de Judá e, se isto não é suficiente, dar-te-ei muito mais. Como ousaste desprezar a palavra do Senhor, fazendo o que é mal a seus olhos? Mataste à espada Urias, o hitita; tomaste como esposa a sua mulher, depois de o teres feito passar à espada pelos amonitas. Agora a espada nunca mais se afastará da tua casa, porque Me desprezaste e tomaste a mulher de Urias, o hitita, para fazeres dela tua esposa». Então David disse a Natã: «Pequei contra o Senhor». Natã respondeu-lhe: «O Senhor perdoou o teu pecado: Não morrerás».


SALMO RESPONSORIAL – Salmo 31 (32)
Refrão: Perdoai, Senhor, minha culpa e meu pecado.

Feliz daquele a quem foi perdoada a culpa
e absolvido o pecado.
Feliz o homem a quem o Senhor não acusa de iniquidade
e em cujo espírito não há engano.

Confessei-vos o meu pecado
e não escondi a minha culpa.
Disse: Vou confessar ao Senhor a minha falta
e logo me perdoastes a culpa do pecado.

Vós sois o meu refúgio, defendei-me dos perigos,
fazei que à minha volta só haja hinos de vitória.
Alegrai-vos, justos, e regozijai-vos no Senhor,
exultai vós todos os que sois rectos de coração.


Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos Gálatas
(Gal 2,16.19-21)
Irmãos: Sabemos que o homem não é justificado pelas obras da Lei, mas pela fé em Jesus Cristo; por isso acreditámos em Cristo Jesus, para sermos justificados pela fé em Cristo e não pelas obras da Lei, porque pelas obras da Lei ninguém é justificado. De facto, por meio da Lei, morri para a Lei, a fim de viver para Deus. Com Cristo estou crucificado. Já não sou eu que vivo, é Cristo que vive em mim. Se ainda vivo dependente de uma natureza carnal, vivo animado pela fé no Filho de Deus, que me amou e Se entregou por mim. Não quero tornar inútil a graça de Deus, porque, se a justificação viesse por meio da Lei, então Cristo teria morrido em vão.


Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
(Lc 7,36 – 8,3)
Naquele tempo, um fariseu convidou Jesus para comer com ele. Jesus entrou em casa do fariseu e tomou lugar à mesa. Então, uma mulher – uma pecadora que vivia na cidade – ao saber que Ele estava à mesa em casa do fariseu, trouxe um vaso de alabastro com perfume; pôs-se atrás de Jesus e, chorando muito, banhava-Lhe os pés com as lágrimas e enxugava-lhos com os cabelos, beijava-os e ungia-os com o perfume. Ao ver isto, o fariseu que tinha convidado Jesus pensou consigo: «Se este homem fosse profeta, saberia que a mulher que O toca é uma pecadora». Jesus tomou a palavra e disse-lhe: «Simão, tenho uma coisa a dizer-te». Ele respondeu: «Fala, Mestre». Jesus continuou: «Certo credor tinha dois devedores: um devia-lhe quinhentos denários e o outro cinquenta. Como não tinham com que pagar, perdoou a ambos. Qual deles ficará mais seu amigo?» Respondeu Simão: «Aquele – suponho eu – a quem mais perdoou». Disse-lhe Jesus: «Julgaste bem». E voltando-Se para a mulher, disse a Simão: «Vês esta mulher? Entrei em tua casa e não Me deste água para os pés; mas ela banhou-Me os pés com as lágrimas e enxugou-os com os cabelos. Não Me deste o ósculo; mas ela, desde que entrei, não cessou de beijar-Me os pés. Não Me derramaste óleo na cabeça; mas ela ungiu-Me os pés com perfume. Por isso te digo: São-lhe perdoados os seus muitos pecados, porque muito amou; mas aquele a quem pouco se perdoa, pouco ama». Depois disse à mulher: «Os teus pecados estão perdoados». Então os convivas começaram a dizer entre si: «Quem é este homem, que até perdoa os pecados?» Mas Jesus disse à mulher: «A tua fé te salvou. Vai em paz». Depois disso, Jesus ia caminhando por cidades e aldeias, a pregar e a anunciar a boa nova do reino de Deus. Acompanhavam-n’O os Doze, bem como algumas mulheres que tinham sido curadas de espíritos malignos e de enfermidades. Eram Maria, chamada Madalena, de quem tinham saído sete demónios, Joana, mulher de Cusa, administrador de Herodes, Susana e muitas outras, que serviam Jesus com os seus bens.


A LONGA ESTRADA
Simão era um homem recto, observante das leis judaicas e respeitado na comunidade. Não se lhe conheciam grandes pecados e em geral era estimado por todos e gozava de uma óptima reputação. Quando a “mulher de má vida”, entra na sua casa (era normal deixar as portas abertas, em dias de festa, para que todos pudessem admirar a fartura do banquete), Simão sente um profundo desconcerto: não aceita a presença daquela pecadora (que provavelmente já tinha encontrado Jesus numa outra ocasião) e choca-o que o Messias se deixe tocar por alguém com aquela má reputação. Simão pertence ao grupo dos “fariseus”, uma casta elitista e ultra-ortodoxa cujo nome significa, literalmente, “separados”. Para eles, Deus é o juiz de quem erra, o patrão que paga em proporção dos méritos e a única forma de preservar a própria pureza (a própria santidade) é “separando-se” dos pecadores.

Jesus, mais uma vez, é revolucionário: o Seu comportamento e a Sua parábola são duas lições que nos indicam uma via radicalmente diversa. Em primeiro lugar, Ele mostra-nos que Deus não se sente conspurcado quando pecadores e marginais O abraçam e beijam. Ele ama sempre, mesmo antes da conversão e do arrependimento. Não exclui, não marginaliza, não afasta. Em segundo lugar, a parábola dos dois devedores não ensina que o perdão resulte do amor manifestado pela mulher. Pelo contrário, é a atitude de misericórdia de Jesus que produz o muito amor da mulher. É o amor que nasce de um coração agradecido, de alguém que não se sentiu excluído nem marginalizado, mas que, nos gestos de Jesus, tomou consciência da bondade e da misericórdia de Deus.

Nesta página do Evangelho, Jesus diz-nos (diz à sua Igreja) que a exclusão e a marginalização não poderão nunca gerar vida nova. Ele mostra o Caminho e assegura-nos que apenas o amor e a misericórdia conseguirão interpelar os corações e provocar respostas de conversão. No entanto, demasiadas vezes seguimos outras estradas e as nossas comunidades não conseguem testemunhar os braços abertos e amorosos do Pai, que nos foram revelados em Jesus Cristo. Somos uma Igreja “em caminho”, que vive um contínuo processo de conversão e purificação. Não podemos renunciar a esse movimento vital, ou inevitavelmente cairemos no farisaísmo. Todos os cristãos (não apenas alguns, mas todos!) são chamados a “caminhar”, a dar o próprio contributo para que a nossa Igreja seja cada vez mais neste mundo, um sinal claro do amor misericordioso (e acolhedor!) de Deus Pai.

Que não haja ilusões: ainda temos muita estrada pela frente. Coragem e bom caminho!


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Soube há pouco, que faleceu um querido amigo: Monsenhor Manuel Bastos, Prior de Peniche durante mais de 60 anos. Neste momento não consigo escrever a devida homenagem que este santo sacerdote merece, mas quero convidar todos aqueles que semanalmente acompanham este blog, a unirem-se a mim numa oração em acção de graças pela vida e testemunho deste homem a quem a minha cidade tanto deve. Junto com o comentário ao Evangelho deste domingo, publico também este trecho de um texto que escrevi há quase dois anos, quando a paróquia lhe organizou uma bonita festa de agradecimento e homenagem.

Amigo sr. Prior: obrigado por tudo e até um dia.


A recordação mais antiga que tenho do sr. Prior é a de vê-lo na igreja de S. Pedro, a dizer, lá de cima do altar, com uma voz bem forte: «PALMAS! MAIS PALMAS! VIVA PORTUGAL!». Não me perguntem qual o motivo de todos aqueles aplausos, porque sinceramente já não me lembro. O que ficou gravado na minha memória foi a alegria daquele momento, o entusiasmo dos que o ouviam e a força daquela voz. Uma voz inconfundível e que para muitos de nós, com aquele seu timbre seguro e cadenciado, será sempre a voz de um amigo, de um pastor, de um irmão.

A minha história está profundamente ligada à figura do sr. Pior, tal como a história dos meus pais, a dos meus avós e a da minha cidade. Foi ele quem me baptizou, despertando-me para a vida da fé, e foi também nele que vi pela primeira vez aquela atenção pastoral pelos irmãos migrantes que, sem sombra de dúvida, influenciou a minha entrada na Congregação Scalabriniana.

Lembro-me bem do dia em que passei pelo Lar de Santa Maria para lhe contar que ia entrar no seminário. Foi no dia 5 de Maio de 1997. Tenho a certeza da data porque, uns dias antes, tinha-se apresentado uma boa oportunidade para lhe contar tudo. No entanto, resolvi esperar mais um pouco: sabia que o seu aniversário era no dia 5 e pensei que uma notícia dessas seria quase como receber uma prenda. E foi mesmo! O sr. Prior não conseguia esconder um sorriso, mas ao mesmo tempo demonstrou sensatez e grande prudência. Recordo muito bem como nessa tarde falámos não só das alegrias do sacerdócio, mas também dos sacrifícios que esta vocação pede. Passaram vários anos desde esse dia, mas nunca mais esqueci a lealdade do seu testemunho sacerdotal.

Paulo VI dizia que «o mundo não precisa de mestres: precisa de testemunhas». Ao longo de todos estes anos de serviço, Peniche tem tido no seu pároco, não só o exemplo de uma pessoa dedicada, empreendedora, honesta e generosa, mas principalmente, o testemunho possante de um verdadeiro homem de fé, de um cristão coerente, de um sacerdote fiel. Para onde quer que eu vá, para onde for que o Senhor me mande, hei-de sempre levar na bagagem todas as coisas que aprendi com ele (...).

Obrigado sr. Prior, por tudo aquilo que nos deu, por tudo o que nos ensinou e, principalmente, pelo seu testemunho de vida (...).

Já passou muito tempo desde aquela minha primeira recordação e, ao longo dos anos, a nossa comunidade paroquial celebrou várias festas onde pôde aquecer as mãos com aplausos entusiastas. No entanto, duvido que alguma dessas ocasiões tenha sido tão merecida quanto a oportunidade de lhe agradecer e homenagear. Mesmo não estando aí, espero que todos consigam “ouvir” a minha voz, que cá de longe na Itália, pede um aplauso sincero, rumoroso e muito grato para si: «PALMAS! MAIS PALMAS! VIVA O SR. PRIOR!».


P. Carlos Miguel Dias Caetano, cs







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sexta-feira, 4 de junho de 2010

X DOMINGO DO TEMPO COMUM (ano C)



Leitura do Primeiro Livro dos Reis
(1 Reis 17, 17-24)
Naqueles dias, caiu doente o filho da viúva de Sarepta e a enfermidade foi tão grave que ele morreu. Então a mãe disse a Elias: «Que tens tu a ver comigo, homem de Deus? Vieste a minha casa lembrar-me os meus pecados e causar a morte do meu filho?» Elias respondeu-lhe: «Dá-me o teu filho». Tomando-o dos braços da mãe, levou-o ao quarto de cima, onde dormia, e deitou-o no seu próprio leito. Depois, invocou o Senhor, dizendo: «Senhor, meu Deus, quereis ser também rigoroso para com esta viúva, que me hospeda em sua casa, a ponto de fazerdes morrer o seu filho?» Elias estendeu-se três vezes sobre o menino e clamou de novo ao Senhor: «Senhor, meu Deus, fazei que a alma deste menino volte a entrar nele». O senhor escutou a voz de Elias: a alma do menino voltou a entrar nele e o menino recuperou a vida. Elias tomou o menino, desceu do quarto para dentro da casa e entregou-o à mãe, dizendo: «Aqui tens o teu filho vivo». Então a mulher exclamou: «Agora vejo que és um homem de Deus e que se encontra verdadeiramente nos teus lábios a palavra do Senhor».


SALMO RESPONSORIAL – Salmo 29 (30)
Refrão: Eu Vos louvarei, Senhor, porque me salvastes.

Eu Vos glorifico, Senhor, porque me salvastes
e não deixastes que de mim se regozijassem os inimigos.
Tirastes a minha alma da mansão dos mortos,
vivificastes-me para não descer ao túmulo.

Cantai salmos ao Senhor, vós os seus fiéis,
e dai graças ao seu nome santo.
A sua ira dura apenas um momento
e a sua benevolência a vida inteira.
Ao cair da noite vêm as lágrimas
e ao amanhecer volta a alegria.

Ouvi, Senhor, e tende compaixão de mim,
Senhor, sede vós o meu auxílio.
Vós convertestes em júbilo o meu pranto:
Senhor meu Deus, eu Vos louvarei eternamente.



Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos Gálatas
(Gal 1, 11-19)
Quero que saibais, irmãos: O Evangelho anunciado por mim não é de inspiração humana, porque não o recebi ou aprendi de nenhum homem, mas por uma revelação de Jesus Cristo. Certamente ouvistes falar do meu proceder outrora no judaísmo e como perseguia terrivelmente a Igreja de Deus e procurava destruí-la. Fazia mais progressos no judaísmo do que muitos dos meus compatriotas da mesma idade, por ser extremamente zeloso das tradições dos meus pais. Mas quando Aquele que me destinou desde o seio materno e me chamou pela sua graça, Se dignou revelar em mim o seu Filho para que eu O anunciasse aos gentios, decididamente não consultei a carne e o sangue, nem subi a Jerusalém para ir ter com os que foram Apóstolos antes de mim; mas retirei-me para a Arábia e depois voltei novamente a Damasco. Três anos mais tarde, subi a Jerusalém para ir conhecer Pedro e fiquei junto dele quinze dias. Não vi mais nenhum dos Apóstolos, a não ser Tiago, irmão do Senhor.


Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
(Lc 7,11-17)
Naquele tempo, dirigia-Se Jesus para uma cidade chamada Naim; iam com Ele os seus discípulos e uma grande multidão. Quando chegou à porta da cidade, levavam um defunto a sepultar, filho único de sua mãe, que era viúva. Vinha com ela muita gente da cidade. Ao vê-la, o Senhor compadeceu-Se dela e disse-lhe: «Não chores». Jesus aproximou-Se e tocou no caixão; e os que o transportavam pararam. Disse Jesus: «Jovem, Eu te ordeno: levanta-te». O morto sentou-se e começou a falar; e Jesus entregou-o à sua mãe. Todos se encheram de temor e davam glória a Deus, dizendo: «Apareceu no meio de nós um grande profeta; Deus visitou o seu povo». E a fama deste acontecimento espalhou-se por toda a Judeia e pelas regiões vizinhas.


«NÃO CHORES»
Abraão, já muito velhinho, estava sentado um dia numa esteira à sombra da sua tenda, quando viu aparecer no horizonte um homem que caminhava na sua direcção. A visão daquele viajante no deserto fez com que Abraão recordasse a visita dos três anjos, que tantos anos antes o tinham surpreendido com a promessa do nascimento de seu filho Isaac. O solitário peregrino aproximava-se cada vez mais do acampamento e Abraão sorria à ideia de viver novamente a experiência da visita de um anjo.

Quando finalmente se encontraram à distância de dois passos, Abraão estremeceu, pois na face séria e grave do homem que o visitava reconheceu o rosto de um anjo, porém, não um anjo de vida, mas sim, de morte. Abraão gritou: «Anjo da morte, pára! Não avances! Antes de reclamares o meu espírito, responde-me a esta pergunta: eu sou o “amigo de Deus”. Alguma vez viste um amigo desejar a morte de outro amigo?» O anjo replicou: «Também eu te faço uma pergunta. Alguma vez viste um homem apaixonado declinar o encontro com a pessoa amada?» Abraão respondeu-lhe: «Anjo do Senhor, leva-me contigo».

Este antigo conto da tradição mística muçulmana, que tem como protagonista o “pai da fé” comum às três grandes religiões monoteístas, apresenta-nos claramente os dois rostos da morte: um assustador e o outro, sereno. No Evangelho deste domingo Jesus fala-nos, não “apenas” com palavras, mas principalmente com gestos. Os milagres que faz são uma linguagem em si, e a ressureição do filho da viúva de Naim comunica-nos uma mensagem muito clara: Ele “é” a Ressureição; o Senhor da vida; o destino e aliado de todos os homens.

Com esta certeza no coração, tudo parece menos assustador e podemos repetir, com confiança, as palavras do salmo 16:

Tenho sempre o Senhor diante dos meus olhos;
com Ele a meu lado, jamais vacilarei.

Pois Tu não me entregarás à morada dos mortos,
nem deixarás o teu fiel conhecer a sepultura.

Hás-de ensinar-me o caminho da vida,
saciar-me de alegria na tua presença,
e de delícias eternas, à tua direita.



(Tenham uma boa semana!)


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