sábado, 23 de outubro de 2010

XXX DOMINGO DO TEMPO COMUM (ano C)



Leitura do Livro de Ben-Sirá
(Sir 35,15b-17.20-22a)
O Senhor é um juiz que não faz acepção de pessoas. Não favorece ninguém em prejuízo do pobre e atende a prece do oprimido. Não despreza a súplica do órfão nem os gemidos da viúva. Quem adora a Deus será bem acolhido e a sua prece sobe até às nuvens. A oração do humilde atravessa as nuvens e não descansa enquanto não chega ao seu destino. Não desiste, até que o Altíssimo o atenda, para estabelecer o direito dos justos e fazer justiça.


SALMO RESPONSORIAL – Salmo 33 (34)
Refrão: O pobre clamou e o Senhor ouviu a sua voz.

A toda a hora bendirei o Senhor,
o seu louvor estará sempre na minha boca.
A minha alma gloria-se no Senhor:
escutem e alegrem-se os humildes.

A face do Senhor volta-se contra os que fazem o mal,
para apagar da terra a sua memória.
Os justos clamaram e o Senhor os ouviu,
livrou-os de todas as angústias.

O Senhor está perto dos que têm o coração atribulado
e salva os de ânimo abatido.
O Senhor defende a vida dos seus servos,
não serão castigados os que n’Ele confiam.


Leitura da Segunda Epístola do apóstolo São Paulo a Timóteo
(2 Tim 4,6-8.16-18)
Caríssimo: Eu já estou oferecido em libação e o tempo da minha partida está iminente. Combati o bom combate, terminei a minha carreira, guardei a fé. E agora já me está preparada a coroa da justiça, que o Senhor, justo juiz, me há-de dar naquele dia; e não só a mim, mas a todos aqueles que tiverem esperado com amor a sua vinda. Na minha primeira defesa, ninguém esteve a meu lado: todos me abandonaram. Queira Deus que esta falta não lhes seja imputada. O Senhor esteve a meu lado e deu-me força, para que, por meu intermédio, a mensagem do Evangelho fosse plenamente proclamada e todas as nações a ouvissem; e eu fui libertado da boca do leão. O Senhor me livrará de todo o mal e me dará a salvação no seu reino celeste. Glória a Ele pelos séculos dos séculos. Amen.


Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
(Lc 18,9-14)
Naquele tempo, Jesus disse a seguinte parábola para alguns que se consideravam justos e desprezavam os outros: «Dois homens subiram ao templo para orar; um era fariseu e o outro publicano. O fariseu, de pé, orava assim: ‘Meu Deus, dou-Vos graças por não ser como os outros homens, que são ladrões, injustos e adúlteros, nem como este publicano. Jejuo duas vezes por semana e pago o dízimo de todos os meus rendimentos’. O publicano ficou a distância e nem sequer se atrevia a erguer os olhos ao Céu; Mas batia no peito e dizia: ‘Meu Deus, tende compaixão de mim, que sou pecador’. Eu vos digo que este desceu justificado para sua casa e o outro não. Porque todo aquele que se exalta será humilhado e quem se humilha será exaltado».


SANTOS E PECADORES
Diante da parábola do fariseu e do publicano, normalmente a minha reflexão (e, certamente, a de muitos cristãos) seguiria esta linha: enquanto que no fariseu vemos todos aqueles que se acreditam irrepreensíveis e olham com arrogância e soberba os que os rodeiam, no publicano vemos a pessoa que reconhece os próprios erros e pede humildemente perdão a Deus. Jesus exalta a atitude do pecador arrependido e aprendemos que vaidade e hipocrisia são obstáculos que impedem o homem de experimentar a graça da misericórdia de Deus. Tenho a certeza de que hoje, em muitas igrejas, se escutarão homílias que seguem esta lógica, mas a leitura de um comentário, escrito pelo Frei Raniero Cantalamessa (pregador da Casa Pontifícia), levou-me a pôr em causa a validade desta explicação e a perguntar-me se não estaria já “fora do prazo” para os cristãos dos nossos tempos.

Não é que a interpretação clássica esteja errada, mas a nossa sociedade é totalmente diferente da de Jesus. Ele contava as suas parábolas a um mundo profundamente religioso, onde a hipocrisia consistia em ostentar a observância dos preceitos e uma imagem de santidade, pois estas eram as qualidades que suscitavam o aplauso das multidões. Na nossa sociedade secularizada e permissiva, os valores alteraram-se radicalmente. O que se admira hoje em dia é precisamente o contrário: o aplauso vai a quem contesta as normas tradicionais e o adjectivo “transgressivo” tornou-se um dos elogios mais desejados.

É precisamente esta nova ordem das coisas que nos obriga a alterar os termos da parábola, se queremos preservar o seu significado original. Os publicanos de ontem são os novos fariseus de hoje! Actualmente são os publicanos (os transgressores) que dizem «Obrigado Deus, porque não sou como aqueles crentes, fariseus, hipócritas e intolerantes, que passam a vida a rezar, mas no fundo são piores do que os outros!». O mundo transformou-se de uma tal forma, que muitos até se esforçam por parecer maus (!), pois temem que alguém os possa apelidar de «santos»!

Uma conclusão prática que podemos aplicar, quer à interpretação tradicional, quer à reflexão que vos propus, é a seguinte: ninguém é totalmente fariseu e ninguém é totalmente publicano. Somos todos um pouco santos e um pouco pecadores. A coisa pior seria comportar-se como o publicano na vida e como o fariseu no templo. Os publicanos eram pecadores públicos, que colocavam o dinheiro acima de tudo; os fariseus eram, pelo contrário, pessoas muito austeras, que tentavam seguir escrupulosamente os mandamentos da Lei. O caminho que devemos absolutamente evitar é precisamente o de ser pecadores (publicanos no dia-a-dia) que pensam ser “justos” (fariseus no templo).

Se inevitavelmente devemos conciliar estas duas dimensões na nossa vida, pelo menos que seja ao contrário: fariseus no dia-a-dia e publicanos no templo. Como o fariseu, esforcemo-nos por não roubar, não enganar, respeitar as leis e pagar os impostos. Como o publicano, reconheçamos, quando estamos diante de Deus, que o que fizemos é sempre pouco e que necessitamos da Sua ajuda e misericórdia.


(Tenham uma boa semana!)



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