sábado, 30 de janeiro de 2010

IV DOMINGO DO TEMPO COMUM (ano C)



Leitura do Livro de Jeremias
(Jer 1,4-5.17-19)
No tempo de Josias, rei de Judá, a palavra do Senhor foi-me dirigida nestes termos: «Antes de te formar no ventre materno, Eu te escolhi; antes que saísses do seio de tua mãe, Eu te consagrei e te constituí profeta entre as nações. Cinge os teus rins e levanta-te, para ires dizer tudo o que Eu te ordenar. Não temas diante deles, senão serei Eu que te farei temer a sua presença. Hoje mesmo faço de ti uma cidade fortificada, uma coluna de ferro e uma muralha de bronze, diante de todo este país, dos reis de Judá e dos seus chefes, diante dos sacerdotes e do povo da terra. Eles combaterão contra ti, mas não poderão vencer-te, porque Eu estou contigo para te salvar».


SALMO RESPONSORIAL – Salmo 70 (71)
Refrão: A minha boca proclamará a vossa salvação.

Em Vós, Senhor, me refugio,
jamais serei confundido.
Pela vossa justiça, defendei-me e salvai-me,
prestai ouvidos e libertai-me.

Sede para mim um refúgio seguro,
a fortaleza da minha salvação.
Vós sois a minha defesa e o meu refúgio:
meu Deus, salvai-me do pecador.

Sois Vós, Senhor, a minha esperança,
a minha confiança desde a juventude.
Desde o nascimento Vós me sustentais,
desde o seio materno sois o meu protector.

A minha boca proclamará a vossa justiça,
dia após dia a vossa infinita salvação.
Desde a juventude Vós me ensinais
e até hoje anunciei sempre os vossos prodígios.


Leitura da Primeira Epístola do apóstolo São Paulo aos Coríntios
(1 Cor 12,31-13,13)
Irmãos: Aspirai com ardor aos dons espirituais mais elevados. Vou mostrar-vos um caminho de perfeição que ultrapassa tudo: Ainda que eu fale as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver caridade, sou como bronze que ressoa ou como címbalo que retine. Ainda que eu tenha o dom da profecia e conheça todos os mistérios e toda a ciência, ainda que eu possua a plenitude da fé, a ponto de transportar montanhas, se não tiver caridade, nada sou. Ainda que distribua todos os meus bens aos famintos e entregue o meu corpo para ser queimado, se não tiver caridade, de nada me aproveita. A caridade é paciente, a caridade é benigna; não é invejosa, não é altiva nem orgulhosa; não é inconveniente, não procura o próprio interesse; não se irrita, não guarda ressentimento; não se alegra com a injustiça, mas alegra-se com a verdade; tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. O dom da profecia acabará, o dom das línguas há-de cessar, a ciência desaparecerá; mas a caridade não acaba nunca. De maneira imperfeita conhecemos, de maneira imperfeita profetizamos. Mas quando vier o que é perfeito, o que é imperfeito desaparecerá. Quando eu era criança, falava como criança, sentia como criança e pensava como criança. Mas quando me fiz homem, deixei o que era infantil. Agora vemos como num espelho e de maneira confusa, depois, veremos face a face. Agora, conheço de maneira imperfeita, depois, conhecerei como sou conhecido. Agora permanecem estas três coisas: a fé, a esperança e a caridade; mas a maior de todas é a caridade.


Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
(Lc 4,21-30)
Naquele tempo, Jesus começou a falar na sinagoga de Nazaré, dizendo: «Cumpriu-se hoje mesmo esta passagem da Escritura que acabais de ouvir». Todos davam testemunho em seu favor e se admiravam das palavras cheias de graça que saíam da sua boca. E perguntavam: «Não é este o filho de José?» Jesus disse-lhes: «Por certo Me citareis o ditado: ‘Médico, cura-te a ti mesmo’. Faz também aqui na tua terra o que ouvimos dizer que fizeste em Cafarnaum». E acrescentou: «Em verdade vos digo: Nenhum profeta é bem recebido na sua terra. Em verdade vos digo que havia em Israel muitas viúvas no tempo do profeta Elias, quando o céu se fechou durante três anos e seis meses e houve uma grande fome em toda a terra; contudo, Elias não foi enviado a nenhuma delas, mas a uma viúva de Sarepta, na região da Sidónia. Havia em Israel muitos leprosos no tempo do profeta Eliseu; contudo, nenhum deles foi curado, mas apenas o sírio Naamã». Ao ouvirem estas palavras, todos ficaram furiosos na sinagoga. Levantaram-se, expulsaram Jesus da cidade e levaram-n’O até ao cimo da colina sobre a qual a cidade estava edificada, a fim de O precipitarem dali abaixo. Mas Jesus, passando pelo meio deles, seguiu o seu caminho.


DISTÂNCIA
Estamos na sequência do episódio que a liturgia de domingo passado nos apresentou. Jesus foi a Nazaré, entrou na sinagoga, leu uma citação de Is 61,1-2 e “actualizou-o”, aplicando o que o profeta dizia, a si próprio e à sua missão: “cumpriu-se hoje mesmo esta passagem da Escritura que acabais de ouvir”. O Evangelho de hoje apresenta a reacção dos habitantes de Nazaré às palavras de Jesus.

O entusiasmo dos habitantes de Nazaré “arrefece” rapidamente depois de um breve momento de admiração e surpresa. Inicialmente a mensagem arrebatou-os, mas um olhar atento à identidade do mensageiro foi suficiente para que tudo desvanecesse. «Filho de Deus? Mas se é o filho de José, o carpinteiro!». Todos conheciam Jesus: viram-no crescer, conhecem a sua mãe e talvez até tenham nas próprias casas algumas mobílias feitas por Ele. É tudo demasiado banal. Não é possível que Ele seja o Messias...

Hoje em dia a “familiaridade” tornou-se um imperativo e cada vez mais desaparece a formalidade nas relações, pois o que antigamente era interpretado como “respeito”, actualmente vê-se como “distância” ou altivez. Aos poucos todos se tratam pelo primeiro nome e termos como “senhor” e “dona” desaparecem da circulação. Também na experiência religiosa várias barreiras caíram e muitos se têm batido (eu inclusive) pelas ideias da Igreja como comunidade, da paróquia como família e da liturgia como encontro de irmãos. Insiste-se sobre a necessidade de diminuir a distância entre sacerdotes e fiéis, entre culto e vida quotidiana, entre sagrado e profano.

Porém não podemos simplesmente concluir que a proximidade seja garantia de um encontro verdadeiro com Deus e não podemos nunca esquecer a grande distância e o mistério que nos separam da Sua realidade. Os habitantes de Nazaré olhavam para Jesus com presunção, seguros de já conhecer tudo sobre Ele e portanto, eram incapazes de abrir o próprio coração à novidade de Deus. Em Cafarnaum porém, onde Jesus chega como um “estrangeiro”, os habitantes conseguiram reconhecer a Sua identidade divina.

Nem sempre é positivo cancelar as distâncias: demasiada familiaridade pode tornar-se um obstáculo à descoberta da presença de Deus. Tal como para admirar um quadro não podemos encostar o nariz à tela, por vezes, se queremos colher a verdadeira imagem de alguém, somos obrigados a dar dois passos para trás. A distância nem sempre é sinónimo de indiferença ou bajulação: pode exprimir também a consciência que temos de não conhecer tudo sobre o outro, tornando-se, nesse caso, condição fundamental para um coração que deseja manter-se sempre aberto à novidade do Evangelho.

(Tenham uma boa semana!)


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